Ter experiências criativas, como dançar e pintar, pode desacelerar o envelhecimento cerebral. É o que aponta um estudo internacional sobre os impactos da criatividade na mente humana que reuniu dados de mais de 1.200 participantes de 13 países, incluindo do Brasil. Publicada na revista Nature Communications em outubro, a pesquisa revela que quem se desafia mais em atividades lúdicas pode manter o cérebro até sete anos mais jovem do que era esperado para a idade.
Essa foi a conclusão dos autores, após observarem maior conectividade em pessoas que têm um hobby criativo, particularmente em áreas cerebrais relacionadas a expertise e experiências criativas em regiões do órgão vulneráveis ao envelhecimento. “Foi verificada a diferença entre o que é esperado do funcionamento do cérebro para a idade e o que se apresentava de fato nas pessoas que tinham atividades criativas”, explica a neurocientista Elisa Harumi Kozasa, pesquisadora do Instituto do Cérebro do Einstein Hospital Israelita. “Revelou-se que quanto maior fosse o nível de especialização e desempenho dos voluntários em atividades criativas, mais jovem era o cérebro, especialmente nas regiões frontoparietais, ligadas a atenção e criatividade.”
A investigação incluiu experts em diferentes atividades e, posteriormente, destacou aquelas que aparentemente trouxeram mais benefícios em atrasar o “relógio” do envelhecimento. A pesquisa indica que o cérebro de dançarinos de tango, por exemplo, aparentava ser mais de sete anos mais jovem. Já o órgão de músicos e artistas tinha entre cinco e seis anos a menos do que sua idade cronológica.
O tango, dança típica da Argentina, é um exemplo de atividade que une criatividade e movimento. “Nos últimos anos, várias pesquisas estão sendo desenvolvidas sobre benefícios da dança como uma atividade dupla, ao mesmo tempo que é um bom exercício aeróbico, estimula desenvolver diferentes coreografias. É diferente da musculação, que não exige a criatividade”, observa Kosaza.
A neurocientista aponta que atividades não pesquisadas no estudo original, como o surfe (que ela pratica), também são bons exemplos dessa interação entre atividade física e engenhosidade. “Uma onda nunca é igual a outra. É preciso se adaptar o tempo todo e é cativante justamente porque traz um desafio intelectual ao lado do físico”, relata.
Redes cerebrais e plasticidade
Segundo a pesquisa, quanto maior o engajamento criativo, mais eficiente se tornava a comunicação entre os neurônios, demonstrando a capacidade do cérebro de se adaptar a novas tarefas e ambientes.
Estimular essa plasticidade cerebral ajuda a preservar a memória, o raciocínio e a coordenação motora, funções que tendem a declinar com o avançar da idade. Segundo os autores, a criatividade tem um papel semelhante ao exercício físico, estimulando a reorganização das redes cerebrais ao trabalhar a inventividade.
Os benefícios foram observados mesmo em intervenções de curto prazo. Uma das etapas foi ver como o cérebro se desenvolvia quando os voluntários eram convidados a jogar um jogo de videogame, Starcraft II, ao longo de 30h distribuídas em um mês. O estímulo levou ao resultado de cerca de três anos da idade cerebral a menos do que era esperado para a idade, mesmo com pouco tempo de prática.
“O fato de treinamentos curtos já terem trazido benefícios é uma ótima notícia, mas temos que ter cuidado quando pensamos em games”, diz Elisa Kozasa. “Vários jogos até são recursos importantes para a reabilitação de pacientes, mas tudo depende do jogo que é testado. O que eles queriam neste estudo era estimular raciocínio rápido e adaptação. Mas nem todo game tem esse enfoque e, portanto, não podemos generalizar demais esses resultados”, pondera Elisa Kosaza.
Ao tratar das limitações da pesquisa, os cientistas alertam justamente que os resultados encontrados não devem ser entendidos como uma fórmula universal para manter o cérebro jovem. Para a pesquisadora do Einstein, é preciso considerar outros fatores, como alimentação, atividade física e aspectos genéticos. “Um bom envelhecimento depende de um conjunto de elementos. Criatividade é uma parte importante, mas não a única”, frisa.
Por: Revista Galileu








