Levantamento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) revela que o Terceiro Comando Puro (TCP), conhecido nos últimos anos pela presença de líderes traficantes que se dizem neopentecostais, já está instalado no Acre.
A chamada “facção evangélica” surgiu em 2002, no Rio de Janeiro, como uma dissidência do Comando Vermelho (CV), contra quem estão em guerra há anos por domínio territorial, segundo o relatório.
Lá, eles são famosos por comandarem o Complexo de Israel, conjunto de cinco comunidades na zona norte da cidade. Além do Acre e do Rio, os criminosos atuam no Espírito Santo, Minas Gerais, Goiás, Bahia, Ceará, Amapá, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul.
Essa expansão, que teria alcançado o Acre em 2024, já faz do TCP a terceira maior força do crime organizado no país, perdendo apenas para o os rivais do CV e o Primeiro Comando da Capital (PCC).
A marca do grupo é a estrela de Davi. Em locais como Fortaleza, por exemplo, o símbolo aparece ao lado de pichações com dizeres como “Jesus é dono do lugar”.
Não há detalhes, até o momento, do tamanho da força da “facção evangélica” no Acre, como municípios e bairros onde os criminosos atuam, uma vez que a chegada da organização ao estado é recente.
O Acre, no entanto, há anos passou a ser visto como território estratégico para o crime organizado, por estar situado na faixa de fronteira com dois dos maiores produtores e exportadores de drogas do continente, o Peru e a Bolívia.

Como age a facção evangélica
Ouvida pela BBC News Brasil, que produziu reportagem especial sobre a expansão do TCP, a pesquisadora do programa de pós-graduação em Ciências Sociais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Kristina Hinz, explica que a facção narcopentecostal se utiliza do discurso religioso para legitimar a expansão territorial e as guerras com outros grupos.
“O combate de inimigos passa a ser compreendido como guerra espiritual. Isto tem ocorrido principalmente em confrontos com o Comando Vermelho”, completa.
Ou seja, os traficantes fazem sua própria interpretação da Bíblia e da fé protestante para praticar os crimes, que são “legitimados com discursos do combate bélico e violento em nome da purificação religiosa e do combate das forças diabólicas, do mal”, reforça a estudiosa.
Além do tráfico de drogas, eles atuam fechando templos de outras denominações religiosas, como terreiros e umbanda e até igrejas católicas. Outra prática comum é a extorsão financeira das comunidades, ações que são inspiradas nas milícias cariocas. No Acre, no entanto, ainda não há registro desse tipo de delitos pelo TCP.
Pesquisadores reforçam que esse fenômeno criminoso ligado à fé evangélica é um reflexo do próprio avanço dessa religião entre o povo brasileiro.
“É um grupo que conseguiu, dentro da esfera criminal, de fato tornar a religião como elemento motivador das coisas”, avalia o sociólogo Luiz Fábio Silva Paiva, coordenador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (LEV/UFC), também entrevistado pela BBC.






