Hoje, mais do que ontem, a maldade humana, na terra, se multiplica sob diversas facetas, teorias e sistemas satânicos. Exemplo claro dessa diversidade da maldade humana é o pragmatismo, sistema filosófico em que a verdade e os valores são relativos, dependentes de sua utilidade tanto para os indivíduos como para a sociedade nos levam a violência. Igualmente, as ações do homem moderno, com algumas exceções, estão representadas pelo homem voltado para o usufruto dos prazeres da carne; prazeres que prevalecem sobre o homem ético, responsável e cumpridor de suas obrigações de cidadão. O perfil, por exemplo, do homem jovem, no mundo em que vivemos, enquadra-se na antiga lei de Gerson: levar vantagem sobre tudo e sobre todos. Massificados pela mídia pornográfica, indutora de maus costumes muitos jovens vivem o hedonismo extremado, antigo sistema filosófico que estabelecia o prazer como o objeto principal da vida. Sexo, droga, bebidas alcoólicas, carros, embalos alucinógenos e tudo mais são o que permeiam a mente de milhares deles. Com tudo isso para curtir adoidado, e sem ter de onde tirar o dinheiro, muitos jovens são levados a planejar e executar assaltos e outros crimes, contribuindo fortemente para o alargamento da violência.
Contudo, sendo este mundo regido por seres racionais, algúem pergunta, como explicar a exagerada maldade humana nele existente? Aparentemente tanta injustiça não tem significação nem propósito. Por que sofrem os inocentes? Como podemos explicar a presença dos males morais e físicos, realmente aterradores? Sendo o mundo a criação de Deus, interrogam os cristãos com perplexidade, qual é a origem e a significação do germe da ira e de todo o enredo da insensatez humana, do interesse próprio e da crueldade, que fazem com que o mal se torne um fato tão terrível e universal na experiência humana?
Face a face com a maldade humana podemos afirmar, à luz das Sagradas Escrituras, que, sendo Deus a própria expressão do amor, o mal e a maldade dos homens, não pode vir de Deus, não pode resultar senão de uma desordem moral na criatura, e o mal físico, se existe, deriva necessariamente de um pecado, se bem que, como diz Santo Agostinho, o mal é ou pecado ou a conseqüência do pecado. É, pois essa maldade humana, chamada de pecado, a causa das doenças, dos sofrimentos humanos, dos tormentos do espírito e por fim a morte física.
Esta argumentação é perfeitamente necessária e concludente, uma vez que os males que efetivamente escravizam a humanidade ultrapassam realmente o que é compatível com uma natureza íntegra, como a que Deus deve ter criado. A natureza na sua totalidade (physis) apesar das enchentes, das secas, dos terremotos e dos “tsunames” é um bem para a raça humana. Anselmo, por exemplo, via na natureza uma imensa bondade de quem a criou. A maldade humana, portanto, é o oposto da bondade observada a partir da própria natureza. Ainda, por uma prova deste gênero, não se pode senão chegar a conjeturar que o mal provém de uma espécie de tara, que pesa sobre todos os homens. A razão, abandonada às suas próprias luzes, não nos permitirá ir muito longe.
Metaforicamente, em sua representação mais célebre sobre a “Cidade Terrena” e a “Cidade Divina” Agostinho diz que o mal é o amor a si mesmo (soberba e egoísmo), o bem maior é Deus. Isso vale para todos os homens na condição de indivíduos. Egoístas, vivendo para si mesmos, desprezam a Deus e, por desprezarem Deus, estão destinados à eterna danação ou maldade. Deste modo, a partir da queda do primeiro homem e do primeiro homicídio; de lá até o presente momento a humanidade vive a representação de Caim (o mal) e Abel (o bem).
Separada de Deus, a humanidade ficou num estado de sofrimento e de vergonha. Como resultado do primeiro pecado, o ser humano perdeu sua liberdade, mas não seu livre-arbítrio. A título de punição divina, ele foi lançado em um estado corrompido conhecido como pecado original, perdendo sua capaciadade de buscar por si mesmo as coisas de Deus. Isso resultou na dependência absoluta do ser humano de uma obra de graça divina em sua alma, para poder caminhar em direção a Deus. O ser humano caído está escravizado ao pecado. Ele não tem capacidade de escolher uma vontade livre de coerção, mas agora está livre apenas para pecar, porque seus desejos se inclinam para o pecado e o des-viam de Deus. O ser humano, segundo Agostinho está “incapacitado de não pecar”. O ser humano só se livrará dessa “incapacidade de não pecar” através da “Graça Divina”
(Consultado: Agostinho, Sto. O Livre Arbítrio. Editora Paulus. São Paulo 1995)
*Francisco Assis dos Santos é professor e pesquisador (de gabinete) em Filosofia e Ciências da Religião.
E-mail: [email protected]