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Dia de mulher

mulheres_rosas_vermelhasTodo dia é dia de índia. Há muito tem sido exatamente desse jeito. Assim como todo dia é dia de mãe, de filha, de tia, de sogra e até da cunhada mal amada, coitada! Imagine só, minha senhora! Todo dia é dia também de lembrar a avó Maria, a minha sertaneja arredia que, nalgum dia, houve por bem dizer de mim ser bom filho, bom irmão, bom pai, bom esposo, com algum exagero, claro, talvez, quem sabe, por ser dela o neto predileto. Ah!… E quanto orgulho sente esta embevecida alma xapuriense, lavada e enxaguada nos tonéis da emoção…
Foi lá na terra Princesa que me ensinaram os segredos de emo-cionar-me, muito embora a razão hoje prevaleça, e muito. A partir daqueles invernos duros e constantes, então, tornei-me um apaixonado pela Humanidade. Depois, a paixão em mim se enredou de tal forma que passei a devotar horas dos meus dias ao meu ardor e ao meu entusiasmo pelos homens e pelas mulheres desta nação / povo que ainda há de cumprir o seu ideal, como bem quer o Chico Buarque.

Ah!… E o belo sexo?
Pois bem. Dia desses, em Xapuri, conversava com um seleto grupo de umas cinco ou seis moças, mais ou menos contemporâneas minhas, e elas me falaram de poucas e boas. Vieram à baila assuntos picantes, sim. Aquele, como todos os dias, era também mais um dia de mulher.
Somos ainda bem jovens e cheios de vida e de graça, da graça que Deus nos dá todas as horas de todos os dias. E eu, ali parado, introspectivo, um tanto ensimesmado, apesar da cerveja, muito mais ouvi que falei. Claro… E já não disse o Confúcio que se há dois ouvidos e uma boca é para que ouçamos bem mais que falemos? E assim foi… Elas tagarelaram mais que araras no barreiro em plumas multicoloridas. Bom de participar. Melhor de apenas ouvir. Afinal, em meio a damas de tão fino trato, nenhum cavalheiro que se preze há de se comportar como um fanfarrão despudorado.

Então, dentre mil e tantas conclusões próprias de uma tarde mais ou menos ébria, ou pouco sóbria, fizeram elas algumas observações sobre os inimagináveis patamares alcançados pelas mulheres ocidentais a partir da década de 1980…

É claro que, segundo prego por este mundão afora, as mais belas em meio ao belo sexo devem, sim, andar de nariz empinado  –  Geisy Negreiros!  –  e sequer olhar para o imbecil e inepto que não tem inteligência suficiente para fazer uma abordagem de forma a expor alma simpática e formação esmerada. Sede mais cuidadosos, homens de Deus! As divas do nosso tempo já se mostram bem mais inteligentes que muitos poetas de bordel que habitam entre nós. (E pensar que um dia a bondosa Emília Sampaio grudou em minha testa angelical um cartaz imaginário onde se lia: conquistador barato! Pode?).
As feministas lutaram, sim, e muito, às vezes em companhia e com o apoio de homens que, como eu, buscam fazer com que elas não se sintam superiores nem inferiores, mas, tão somente, diferentes daqueles que compõem o gênero oposto.

Nas duas ou três últimas décadas, a humanidade rejubilada viu que as mulheres são, realmente, mais organizadas. A visão mais abrangente do todo as faz mais capazes de estabelecer distinções entre dados e fatos. A atenção, o poder de concentração e o esmero são marcas preponderantes. A ex-senadora e ex-ministra, Marina, quando sob o brilho das luzes da mídia, tinge-se de uma luminosidade indescritível que encanta a todos e se faz sempre muito pertinente no que é, no que diz e vice-versa. A presidente loura da corte suprema, Helen Grace, é outra que muito bem se sobressai acima da média de homens e mulheres efi-cientemente inteligentes.

Na escola pública, as novas gerações de moças que cursam o ensino médio evoluíram tanto que, hoje, oitenta por cento delas  –  pelo menos nas terceiras séries do ensino médio, onde tento ensinar o bom uso do Português  –  têm notas e participação melhores que as dos homens. Certamente, o João, o Alfredo, o Lucas, o Emerenciano e o Pedro Paulo, dentre tantos, em futuro já bem próximo, hão de esquentar a barriga no fogão e esfriar no tanque, posto que não se esforçam na busca dos melhores dias que todos querem, menos eles, os meus alunos crassos… Ah, coitados!
Mas é preciso que as mulheres modernas não vistam a alma feminina com essa fleuma e essa arrogância que têm maculado a feminilidade de algumas. A sabedoria poderia vir de um diálogo bilateral onde as razões de ambas as partes sejam levadas em consideração. Talvez os homens tenham levado a Humanidade perdida por caminhos tão tortuosos porque não tinham a sensibilidade das mulheres. Que elas sejam, então, mais amáveis e mais amadas, principalmente, pelos cavalheiros que, ao meu feitio, ainda lhes rendem homenagens, ainda lhes afastam a cadeira para que as musas tomem assento antes, no restaurante ou no boteco. Que elas sintam que, por trás de cada bom pajem, há sempre a esperança de um parceiro sensível que lhes abrirá a porta do carro num gesto que significa muito mais cortesia e singeleza que subserviência… Tudo isso, sem ter que observar, ao pé da letra, o que disse o Vinícius de Moraes no Samba da bênção.

Senão é como amar uma mulher só linda; e daí? Uma mulher tem que ter qualquer coisa além da beleza. Qualquer coisa de triste, qualquer coisa que chora, qualquer coisa que sente saudade. Um molejo de amor machucado. Uma beleza que vem da tristeza de  se saber mulher, feita apenas para amar, para sofrer pelo seu amor e para ser só perdão.    
Mas é preciso ir além e coçar mais e mais a memória e trazer à nossa lembrança o que escreve a poetisa portuguesa Augustina Bessa-Luís:
Nós, as mulheres, o que nos faz amar um homem é aparentá-lo com tudo o que amamos  –  o tempo da crise da puberdade, da gestação, do enigma, os primeiros rostos, as primeiras carícias, os primeiros medos.

Por tudo isto, a todas elas dedico esta prosa meio poética tão verdadeira. Com muito mais amor e muito mais carinho desse sempre, sempre e sempre seu amigo e amante, poeta pulsante e carinhoso, esteta denso e  eterno, cortejador e feliz. Obrigado por tudo!

* José Cláudio Mota Porfiro é escritor.

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