Provavelmente a melhor definição sobre a guerra foi nos dada por Karl Von Clausewitz (1780-1831): “a guerra não passa da continuação da política por outros meios”
Cipriano, Bispo de Cartago, no passado longínquo, escreveu ao seu amigo Donato: “Este mundo parece alegre Donato, quando o admiro deste belo jardim, à sombra destas videiras. Contudo, se escalo alguma grande montanha e contemplo as vastas terras em derredor, você sabe muito bem o que vejo: bandidos na estrada, piratas nos mares; nos anfiteatros, pessoas sendo mortas para agradar as multidões, que aplaudem e sob todos os tetos vejo miséria e egoísmo. É naturalmente um mundo mau, Donato, um mundo incrivelmente mau”.
Pois é, este é o mundo e seus paradoxos. Aqui carnaval, futebol e cachaça. Ali, por exemplo, na Líbia, é a opressão interna produto de longos anos de ditadura insana e a carga externa advindas dos senhores do mundo com seus artifícios (míssil) devastadores.
Falando de guerra e rumores de guerra, o que se poderia dizer aqui, que alguém já não tenha dito. Provavelmente a melhor definição sobre a guerra é nos dada por Karl Von Clausewitz (1780-1831) “a guerra não passa da continuação da política por outros meios”. Clausewitz diz, metaforicamente falando, que a guerra é comparada: na filosofia política, a um jogo de estratégia, como o xadrez; na filosofia escatológica, a uma missão ou ao desfecho de um drama; na filosofia cataclísmica, a uma explosão ou a uma epidemia.
É verdade, a guerra não passa da continuação da política por outros meios. As conseqüências da guerra são intermináveis. A guerra age como um impiedoso eliminador dos povos fracos. Politicamente estimula a invenção, cria armas, que depois dizem, se tornam em instrumentos úteis, bem como as artes da guerra, que depois se tornam artes de paz. Roma construía estradas nos domínios de terras conquistadas com fins estratégicos. É pródigo o aforismo milenar: a propriedade é a mãe do Estado, e a guerra, o pai.
Nietzsche adorava o Estado conquistador, “uma raça de conquistadores e senhores, que com toda sua organização guerreira e todo o seu poder crava as terríveis unhas sobre uma população tremendamente superior em número, mas sem forma e organização”. Vale à pena citar que Nietzsche exaltava a guerra, não via outra forma de conquistar o mundo. Em certo momento de sua vida, ainda jovem, alistou-se como auxiliar de enfermeiro, com o fim de participar duma guerra; ao experimentá-la pediu dispensa horrizado com o que viu nos campos de batalha.
Quanto à paz, mesmo que haja interminável apelo mundial dos pacifistas, sob o argumento de que a guerra não é a melhor maneira de solucionar disputas humanas, pois deixa sempre, no curso da história, em seu séquito um rio de sangue. Ademais, moléstias de todos os tipos resultam da guerra; a fome, a crueldade e a morte. Fato inegável, já que só durante a Segunda Guerra Mundial, houve um total de mais de 30 milhões de soldados mortos, não se incluindo aí os mais de 20 milhões de civis mortos.
Ora, se sabemos de antemão os efeitos nefandos das guerras, pergunta-se por que fazê-las? Por que existem as guerras entre as nações? Quais são os interesses em fazer guerras? As guerras são necessárias? Bem, ontem era a destruição e a pilhagem dos mais fracos; hoje, é o danado do ouro negro, ou não é? Apesar de todos os males, a paz não vem!
Durante séculos, legislaturas e parlamentos têm tentado assegurar a paz. Em tempos idos, líderes como os Césares, Constantino, Carlos Magno, Napoleão, os “czares” do oriente, e os reis do ocidente, todos, cada um em sua época, prometeram paz duradoura. No entanto, todos falharam. De a muito se proclamam audaciosos planos de unidade e irmandade global: Bruxelas, Nova York, Genebra, Tóquio e Washington, D.C., foram sedes, ao longo dos anos, de movimentos em prol da paz. Entretanto, não existe paz universal, e o mundo se cansa de promessas vazias. O mundo está num caos tão desesperador, durante tão grande parte de tempo, que cada um de nós se pergunta, a si mesmo: Seria a paz uma mera ilusão?
Karl Barth (1886-1968) em dias pretéritos, quando visitou as Nações Unidas, fez um pronun-ciamento que corrobora com a idéia de Clausewitz que a guerra avaliada pelo prisma da filosofia escatológica, é uma missão ou o desfecho de um drama. O drama dos fins dos séculos, afinal é escatológico. Disse o teólogo suíço: “a organização internacional poderia ser uma parábola terrestre do reino divino, mas a paz verdadeira não será feita aqui, embora possa parecer uma aproximação. A paz será feita pelo próprio Deus, ao final de todas as coisas”.
Enquanto o fim dos tempos não chega, pode demorar milênios, seria de bom alvitre que os senhores que dominam as nações seguissem a premissa do brasileiro Celso Lafer, para quem: “o uso da força só é admissível quando todas as alternativas diplomáticas se esgotam”.
* Francisco Assis dos Santos é professor e pesquisador bibliográfico em Filosofia e Ciências da Religião.
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