Noticiou-se na mídia online que a filosofia vai ter, em 2012, livros didáticos distribuídos nas escolas de educação básica da rede pública. A medida é a consolidação, na prática, da decisão do Conselho Nacional de Educação (CNE), que em 2007 inseriu obrigatoriamente o estudo da Filosofia no Ensino Médio. Assim, depois de 47 anos fora dos currículos das escolas de educação básica no país, a filosofia está de volta.
A minha satisfação é grande. Por quê? Porque o estudo da filosofia, com certeza, dará ao jovem brasileiro arguto por natureza, a oportunidade de não ser presa fácil de sistemas perversos. Ao mesmo tempo, com a filosofia, o jovem tupiniquim, ordenará melhor o pensamento e irá refletir sobre os problemas sociais que enfrentamos, principalmente no campo da política partidária que no Brasil, do ponto de vista ético, é uma colcha de retalhos ou, na melhor das hipóteses, um amalgama de propostas oportunistas. Exemplo grosseiro é a tal da “reforma política” que nunca passa das altercações simplórias.
A partir de agora, nos rincões da pátria mãe, o jovem brasileiro, irá se deparar com uma série de interrogações, notadamente no campo da ética e da filosofia política; balizará sua opinião ou consciência crítica sobre a conduta dos nossos gover-nantes, uma vez que a filosofia política, que é também social, está intimamente ligada com a ética. Arguições do tipo: A ética diz respeito às ações dos indivíduos, a filosofia política está interessada nas ações de um grupo ou sociedade? A filosofia política analisa conceitos tais como a autoridade, o poder, a justiça e os direitos indivi-duais? Procura, também, examinar por que a sociedade é como é? Por que a guerra, o crime, e a pobreza existem? E a questão do multiculturalis-mo, cujo debate mobiliza grande parte das nações desenvolvidas, especialmente a Europa como deve ser enfrentado?
Saberá que a filosofia política faz reflexões sondando os alvos da sociedade, entenderá qual papel o Estado pode desempenhar e quais são estes alvos. A filosofia política, despeito de questionar temas no campo teórico, trata, ainda, de perguntas de caráter prático, tais como: Quem deve governar a sociedade? A obrigação política é comparável com outros tipos de obrigação? São compatíveis à liberdade e a organização? Qual é o significado da democracia, e é ela uma forma justificável de governo? Qual deve ser o papel do governo numa comunidade corretamente organizada?
Para esta última interrogação, à luz do meu entendimento, posso adiantar ao futuro estudante de filosofia que a resposta mais plausível ainda é o modelo citado por John Locke (1632-1704). O empirista inglês defendia “a constituição de um pacto social entre homens livres, para a preservação da vida, da liberdade e da propriedade privada”. O governo, para ele, “seria o executor da vontade dos cidadãos e o soberano (presidente) poderia ser afastado caso não cumprisse essa função”. Essas teorias se articularam na defesa da necessidade do Estado como entidade subalterna aos indivíduos. Nunca é demais afirmar que o pensamento político de Locke influenciou bastante a sociedade ocidental, tornando-se a primeira teorização do liberalismo político no Mundo Moderno. Desgraçadamente, passado mais de 300 anos, não avançamos muito em relação à tese de Locke. Em contrapartida o que se vê, infelizmente, nos dias atuais, são os governantes, de forma soberana, exercer poder absoluto sobre os indivíduos, que em uníssono só sabem dizer amém.
Alguém poder dizer, em contra posição, que essas são teorias tedio-sas, para não dizer, anacrônicas. Acontece que a gente de quase todo o mundo civilizado, desiludido e cético, com as novas medidas reparadoras, dos que detém o poder no século 21, busca nos pensadores de períodos passados respostas para entender suas agruras. É oportuno dizer que as obras de Alexis Tocqueville (1805-1859), consideradas uma afronta contra o Estado, estão em evidência nos principais centros acadêmicos da atualidade.
A história da filosofia diz que com os gregos, surge uma nova atitude, que tem êxito devido às condições sociopolíticas: a de não aceitar relatos sobre o mundo com base na tradição, mas questionar e exigir razões para aquilo que é aceito. De lá pra cá, de Platão a Marx, a filosofia tem sido não só interpretação do mundo, mas projeto de transformação do homem, quer dizer política, ética e pedagógica. Assim, repito o que disse outro dia, os elementos críticos e avaliadores da filosofia podem ajudar a não nos deixarmos iludir pelas evasivas e omissões das técnicas políticas e publicitárias.
Digno de menção é o fato de Maria Lúcia Arruda Aranha, antiga professora de filosofia, ter seu livro selecionado, entre os títulos, que serão distribuídos aos alunos da rede pública pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).
* Francisco Assis dos Santos é professor e pesquisador bibliográfico em Filosofia e Ciências da Religião. E-mail: [email protected]