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Como nasceu o amor romântico

A pergunta que se faz não interessa a muita gente. Mas refletir sobre ela faz lembrar que o amor nunca é demais e que as pessoas devem se amar mais e melhor em cada novo dia, dando maior sentido à vida. Essa motivação deve povoar qualquer terra em que os seres humanos amem, bem como qualquer tempo onde as pessoas sonhem. Deve habitar a vida.

Refletindo sobre a questão andei por muitos lugares procurando uma resposta. Apelei para os historiadores, li sobre o amor através dos tempos e, seguindo, passo a passo, a construção da civilização ocidental, estudei o amor entre os Gregos, o amor entre os Romanos, o amor entre os Judeus. Entrei no cristianismo e li o amor na ótica de Agostinho, Jerônimo e Tertuliano, e me vi na Idade Média e lá contemplei o amor dos plebeus e dos nobres, e até o amor escondido nos conventos. Depois, saí pelos castelos acompanhando os trovadores e vi nascer entre eles o amor cortesão, onde só os filhos primogênitos se casavam por causa das heranças, que não eram divididas. Assim, sobravam vários jovens solteiros que se apaixonavam pelas damas e que só podiam viver um amor idealizado, logo sofrido.

Também, notei que o amor se fez ridículo, desprestigiado, tanto que na Idade da Razão ele fora reduzido à mera sensualidade. Seduzia-se pelo prazer de seduzir e não necessariamente pelo prazer do amor. Foi ali que encontrei Giovani Jacopo, Casanova e Don Juan Tenório de Servilha, o célebre Don Juan, personagem encantador da comédia de Tirso Molina, no século XVII.  Nasceu, nesta esteira, no Ocidente, o amor romântico, tendo por base um conjunto de práticas que povoam as mentalidades amorosas desde o século XII, quando surgiu o amor cortês. Entre elas estão: a não aproximação dos corpos, comunhão de almas propostas pelo cristianismo, idealização do bem amado, abdicação ao amor a si próprio, completa fidelidade. A principal característica é amar o ato de amar, ou seja, amar o amor e não um outro, não importando possuir o objeto de amor, mas sim o sofrer e até o morrer por amor. Antes, as pessoas não casavam por amor. Isso é uma coisa recente, uma vez que o casamento era algo muito sério para se misturar com amor.

No século XVII o amor chegou com novo alento. Trazia sonhos e fantasias. Era o amor romântico, o amor de Pierrot e Colombina, Romeu e Julieta, o amor de Tristão e Isolda, todos rígidos e marcados por impossibilidades. Quanto mais obstáculos a transpor, mais apaixonado ele se torna. Entretanto, em um determinado momento, interesses econômicos introduziram esse tipo de amor no casamento, transformando toda a sua história. A chegada do amor romântico fez do casamento o meio para as pessoas realizarem suas necessidades afetivas.

Até a Revolução Industrial, no final do século XVIII, as pessoas moravam mais no campo, junto a vários outros membros da família, o que fazia com que sentissem afetivamente amparadas. Os casamentos aconte-ciam por razões econômicas e políticas. Por isso duravam a vida toda. Não havendo romance nem expectativa de satisfação sexual, não havia decepções, e ninguém pensava em se separar.
Mas as fábricas e os escritórios que surgiam foram atraindo os homens para trabalhar nos centros urbanos. Nasceu, então, a família nuclear – mãe, pai, filhos – agora sozinhos na cidade. Para que o casal suportasse viver assim, longe daqueles com quem tinha laços afetivos, inaugurou-se o amor romântico no casamento.

O modelo de amor romântico, cuja paternidade foi atribuída a Rousseau, consistia em um projeto amoroso que era também uma proposta filosófica e política para a sociedade burguesa em ascensão. Na visão rousseauniana, o amor apaixonado devia ser a base da construção da família, pilar da sociedade. Assim, o ideal de amor romântico integra a sexualidade natural do homem com o amor e o casamento, propondo um amor recíproco e indissolúvel, cuja finalidade última é a felicidade. O amor deve ser exclusivo e eterno para garantir a estabilidade da família e levar adiante o projeto político. O amor romântico integra a natureza humana com os objetivos da socie-dade política, pondo as paixões a serviço da comunidade e da vida pública.
Ao concluir, observe o leitor haver muito para ser dito. Há uma tese interessante do suíço Rougemont, onde ele afirma que a idéia do amor romântico nasceu no Ocidente, no século XII, do encontro entre a poesia trovadoresca e o pensamento de uma seita herética. Válida ou não, interessante ler e, também, mergulhar no mito de Tristão e Isolda, nos filmes hollywoodianos, passando por Shakespeare, Mozart e Freud, enfim, perceber o que dizem sobre o amor romântico, um amor que embala a vida de tantas pessoas e que o mundo moderno parece ter devorado. Mas tanto o amor cortesão quanto o amor romântico são invenções da cultura, e como a cultura muda com o tempo, uma concepção de amor que foi boa em determinada época pode se tornar anacrônica e até ridícula em outra. Importa perceber que o amor é plural e não singular e que há inúmeras formas de amar, tantas quantas culturas existem no mundo.

DICAS DE GRAMÁTICA RESIDENTE À/ NA RUA XV?
A rigor, como os verbos morar, residir, situar, localizar e semelhantes regem a preposição em, deveria se usar na e não à nos casos específicos. Tudo bem, tanto é que se fala assim:
      ¨ Residimos na rua Tupi.
      ¨ A casa está situada na avenida dos Guararapes.
      ¨ Você ainda mora na mesma travessa?
      ¨ A sede do Partido se localiza na rua XV.
Mas, por obra do dinamismo da língua, incorporou-se à escrita o emprego de à no lugar de na como complemento de tais verbos diante de logradouros como rua e avenida. O mesmo acontece com seus derivados morador, residente, domiciliado:
      ¨ Residente à rua XV.
      ¨ Manoel Silva, morador à rua Bosque, requer…
      ¨ Vende-se casa (situada/sita) à Avenida Nações Unidas.
      ¨ Aluga-se imóvel (localizado) à Av. Getúlio Vargas.
      ¨ Vamos  estudar no IESACRE, à R. Ponta Porã, nº 100.

GRAFIA DAS HORAS
¨ A grafia que deve ser adotada em jornais, sentenças, acórdãos, convites, convocações, cartazes e coisas do gênero é a seguinte:
– Hora redonda: às 8 horas ; 10 horas ou 10 h [abreviação sem ‘s’ e sem ponto]
– Hora quebrada: às 8h35min; 10h05min; 10h35 [sem dar espaço entre os elementos]
¨ A grafia por extenso – que é menos visual – se reserva para convites formais como o de um casamento: A cerimônia será realizada às dez horas do dia vinte de maio.

Luísa Galvão Lessa – É Pós-Doutora em Lexicologia e Lexicografia pela Université de Montreal, Canadá; Doutora em Língua Portuguesa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Mestra em Letras pela Universidade Federal Fluminense; Membro da Academia Brasileira de Filologia; Membro da Academia Acreana de Letras.

 colunaletras@yahoo.com.br

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