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Legislando em causa própria

Neste artigo, começo citando, como exemplo, a Câmara Municipal de Pradópolis/SP que, sem consternação nem pudor, apresentou na sessão ordinária do dia 12/09, projeto de resolução (lei) fixando o salário do vereador a partir de 1º de janeiro do ano que vem em R$ 5.900,00 (CINCO MIL E NOVECENTOS REAIS), valor estratosféricos para o tamanho do município. Este salário é para o vereador comparecer na Câmara apenas duas vezes por mês. Eu disse duas vezes por mês, não é por semana, não! É, de longe, o maior salário do Brasil para vereadores de cidades do mesmo porte. A população de Pradópolis fez um abaixo-assinado que tem por finalidade exigir a não aprovação do aumento salarial para os vereadores e bem como a instituição de um projeto de lei que torne obrigatório a realização de plebiscito para o aumento salarial dos membros dos poderes legislativo e executivo.

Legiferar em causa própria foi à tônica das casas legislativas municipais da maioria dos municípios brasileiros. Numa cidade do Estado da Bahia o aumento do salário dos vereadores chegou patamares absurdos. O mais cruel é que esse mau exemplo, ou efeito cascata, começou na Câmara dos Deputados, em legislação passada. Quem não se lembra daquele momento em que o deputado Aldo Rebelo (PCdoB/SP) ao lado do então presidente do Senado, Renan Calheiros, imagem mostrada, na ocasião, pelos meios de comunicação a toda gente brasileira, anunciando o novo salário dos nossos “dignos” representantes no Congresso Nacio-nal. À época, a imprensa bem como a opinião pública, considerou obsceno o reajuste do salário dos deputados e senadores. Essa ação em causa própria confirma e expõe publicamente, o quadro de desprezo que o legislativo brasileiro (poder parlamentar representativo do povo) tem pela gente em geral, pois que foram criados constitucionalmente para legislar, fazer leis, em favor do povo.

A meu ver, ao terminar o ano legislando, graciosamente, em causa própria como fez a Câmara de Municipal de Pradópolis, ou qualquer outro poder legislativo municipal, esses “representantes do povo” colocam em xeque sua probidade (honestidade), que já está, até em nível de Congresso Nacional, por todos os escândalos notórios e públicos, seriamente comprometido.
Assim, por mais otimista que sejamos não podemos contornar ou camuflar essa realidade que reflete o nosso legislativo. Vícios do poder público que, desgraçadamente, se perpetuam. Principalmente, porque a atual legislatura municipal, que no apagar das luzes, dobra o próprio salário, é uma das mais corruptas que os municí-pios brasileiros já abrigaram. Por outro lado, no quesito administração do erário público municipal, só no contexto de Acre, quase todas estão comprometidas: “com poucas e honrosas exceções, a maioria dos atuais prefeitos está encren-cada com a Justiça”. Diz um famoso colunista destas plagas.

Enquanto isso aqui fora, noutro extremo, a massa honesta, terá que sobreviver com o parco aumento salarial que já se especula Brasil afora. Precisará, então, o honesto pai de família, constituído da maioria dos brasileiros, tirar forças do recôndito da alma para sobreviver, honradamente, com salários mínimos, que não atende as suas necessidades mais ínfimas. Brasileiros, homens e mulheres, jovens e adultos, que, ano após ano, lutam heroicamente com  suas famílias, na busca do pão nosso de cada dia, sem serem devidamente remunerados pelo labor diário. É a nação brasileira debaixo da influência da miséria, da pobreza e da marginalização que atinge setores imensos da população, que tem todo o direito de ficar com raiva dos que estão no poder;  nação, que pelo visto, não pretende virar a mesa pelas vias da violência. É o que se percebe nesse povo de boa índole, mas que já deu, de forma democrática, através do voto nas últimas eleições, o seu recado, eximindo da vida pública àqueles que só legislaram em causa própria. Desculpem a redundância!

A partir de agora, o que se espera da sociedade brasileira, tão bem informada pela mídia denuncista é cobrar a tal “reforma política” que inibiria, a priori, os ardis aviltantes da classe política. Ademais, estamos na obrigação, enquanto sociedade organizada, de não renunciarmos ao nosso papel de fiscais daqueles a quem passamos procuração, na última eleição municipal, e cobrar responsabilidade no uso da coisa publica. Se negligenciarmos tal missão, estaremos, inexoravelmente, enquadrados na assertiva do filósofo clássico Platão: O preço que o homem de bem paga por não se envolver em política é ser governado pelos maus políticos.

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Categories: Francisco Assis
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