X

O Rio Acre caminha em noites escuras

Rio Acre você é a catraia universal que passa recolhendo pescadores à habitar margens das moradas do Altíssimo. Vens da floresta exultante no colo de um Mestre “caseiro,” amável, que traz de sua longa caminhada certezas de que a perenidade segue os rios.

Magnânimo, disse o pescador: sem tua água me sinto enrugado ao olhar no espelho. Agora posso entender porque escolheste o vale do rio Acre para pescar pescadores e discípulos!!! Com todo teu amor, faremos juntos a viagem que todo rio faz.

Tal qual o pescador, conhecemos teus estirões e tuas voltas, da mesma forma  que o Mestre conhece cada homem que habita tua planície. Reconhecemos, voltas o rio faz, volta, nada, volta alagar. Assim, te guio da proa para não encalhar.

Este Rio que passa pelo vale dos acreanos antes de se entregar e encher bilhas de tradições culturais disse: nasci neste vale para semear, saciar  e erradicar a cultura da escuridão, do medo e da dor.

Sem olhar o tempo nem as horas na travessia em memória, se vê como horizonte no fundo do nada, atado na vulnerabilidade de um puído fiapo do aplauso que emudece a cada segundo vidas, a procura do rumo  na quilha do luar.  Sem você rasgo segredo, passo frio. Quando digo que você é um rio novo é porque te vejo em cada menino que nasce pastoreando fieis na várzea.  

Corro do medo e perco o cio. Um rio que passa sem água é o mesmo que  assistir a vida se desmanchar em mágoa. Sinto verdadeiramente que há muito vem sofrendo e sendo humilhado como se fosse um fruto verde  na fruteira  do tempo, fora de tempo. Você é o fruto da liberdade que oferece a água do seio para saciar a humanidade, batendo forte, quebrando amarras e se pondo a correr  diante de nós.

Sua água escassa, desperdiçada, margens partidas, curso inundado, tendo a seca e a cheia o verão e o inverno regendo o ponteiro do tempo. No tempo que balseiros desciam arrastando aceiro da vida. Transforme o tempo, conte história e humanize o vale mesmo que nossos anseios sintam-se feridos, ainda assim, não permita que te arrastem para a miséria sem rumo. Nossas ações nem sempre se expressam em palavras ou atitudes palpável, grande e esplendorosas. Você não pode morrer! Existe luz,  muita luz no universo e em nós todos. tal qual as águas do Juruá, em pleno inverno, descendo firme e resoluta, que tudo inunda e a várzea fertiliza. Dessa forma o povo poderá tomar para si a decisão de construir um novo futuro.

Não é de mais repetir que a milênios os rios guardam mistérios, a floresta traz o soluço abafado de cada ser. O tempo chora calado o medo da escuridão, como geme de amor o coração em noite escura, ultrapassando limites da luz.

Ofereça um sorriso largo que brotará o prenúncio de um mundo novo enquanto sonho, anjos cansados me levam para além dos limites do teu curso toldado, escoando o medo da morte.

Vens de um tempo que passa marcando o destino de um vale, tal qual o roxo tinge a rocha, o branco a areia no barranco, o vermelho a colori argila. Assim, a humanidade celebra a vida dos frutos do teu amor.

Segredos antigos unem espigões distantes: o céu e a terra. Na várzea do vale nos ensinastes que o caminho do amor segue por outras pegadas que não se perdem no infinito, nem no sono profundo que a imensidão deste mundo canta pra você, tal qual as flores que vão semeando amor, espalhando paixão, abrindo corações para verdades da suprema liberdade.

Este homem que encanta teu vale vem do mais profundo mistério, de um impulso vital, de um sopro supremo de vida, cravado na alça de um vôo cada vez mais alto: Do leito ao curso da vida, do seio da tua nascente, na forma mais singular do amor, mesmo que seu vale já não navegue com segurança neste início de século.

* Claudemir Mesquita é professor, escritor membro da Academia Acreana de Letras e presidente da Associação Amigos do Rio Acre.

Categories: Espaço do Leitor
A Gazeta do Acre: