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A burra de Balaão!

  O ex-presidente Lula, numa certa ocasião, invocado com as contínuas greves dos servidores públicos, pediu calma a “brasileiras e brasileiros” até chegar à época propícia, ou determinada, da colheita, sem murmurar ou fazer  protestos. Calma  e resignação, vocábulos sinônimos de paciência, relacionam-se com o tempo. Implicam em esperar. Esperar é uma tarefa difícil e, também, uma virtude esquecida pela geração globalizada.  

  Num mundo assim,  em que a ansiedade é o grande algoz do homem, o ansiar por melhores dias, ou inquietar-se por eles, não assegura aos nossos corações que dias melhores irão surgir antes do tempo próprio. Calma, então, é a capacidade de esperar por mudanças, sem demonstrar ansiedade exagerada, pois etimologicamente, o termo paciência, usualmente envolve noções de longanimidade. O problema é como ter calma num país em que, cada novo ano, o governo derrama medidas cerceadoras contra a economia nacional, transmitindo  impaciência e inquietação.

 Contudo, como controlar as ansie-dades, por exemplo: das classes representativas da educação, da saúde, dos transportes,  do judiciário e do servidor público em geral. Do pai de família, profissional honesto, que não encontra condições de sustentar sua família com seu pequeno salário e ainda vê seus filhos sendo empurrados na direção das praças e ruas em busca de sobrevivência. Posto que a rea-lidade do trabalho infantil, pior ainda, da exploração de crianças, explica muitas vezes o número elevado de evasão escolar na faixa etária de 7 a 14 anos, aumentando mais ainda o índice de analfabetismo no Brasil.

  Como pedir calma a esse mesmo pai, cuja familiar vai sofrendo toda a deterioração que o contexto maior vai lhe impondo. A família que era vista como uma unidade, agora é esfacelada. Os vínculos afetivos entre marido e mulher e entre pais e filhos se rompem em definitivo. Afinal o filho ou a filha está nas ruas, entre outros milhares de crianças, se iniciando no cigarro, na bebida, nas drogas ilícitas e na prática sexual precoce.

  Como pedir calma aos idosos que, ilusoriamente, vão se retirando da atividade econômica porque se aposentam e deixam de trabalhar. A grande maioria não consegue acumular economias necessárias para a velhice. Não produzem, não consomem de acordo com as expectativas, não interessam ao sistema econômico vigente, salvo as agências de empréstimos consignados. Com magra aposentadoria, sozinhos vão morar com os filhos e noras ou genros, muitas vezes criando sérios conflitos, sendo então encaminhados para os asilos onde quase sempre caem em profundas crises de depressão.  Isso para não falar da falta de segurança em todos os níveis da vida privada e pública, da violência alarmante e de outros males que assolam os quadrantes da Nação brasileira, deixando a todos, até mesmo nós que vivemos aqui no Acre onde não deveria haver tanta violência, sobressaltados.

  É inegável, que vida existencial, desculpe a redundância, demanda da gente a capacidade de perseverar face às dificuldades, ou até mesmo sofrer tudo sem perder o ânimo; exercitar com tenacidade, própria de cidadão sofrido, muitíssimo provado por meios de perdas, sofrimentos e outros males existenciais, sem perder a fé nos poderes constituídos e continuar caminhando com coragem e calma.

  Sei  que para suportar tudo isso é preciso mais do que calma. Será necessário: bravura! Porquanto de todas as virtudes, a bravura é sem dúvida a mais universalmente admirada. Não atos de coragem isolados. Mas, a bravura da paciente gente brasileira.  Aquela bravura, organizada, pacífica, que não recua diante de consequências adversas, na realização de seu dever. A propósito, se me fosse permitido pedir algo a Deus, neste momento cruel que atravessa o mundo, pediria o dom da coragem; não a coragem dos patifes ou dos celerados, facínoras e malfeitores, notadamente do erário público. Mas, aquela coragem  inserida, segundo os filósofos gregos, nas quatro virtudes cardeais do homem: à  sabedoria, à moderação e à justiça. Pelo bem de todos!
 
  Talvez a fábula a seguir nos ajude a melhor compreender a raça humana. Conta-se que num reino, desses muitos que existem por aí, um mágico da corte, que não obtinha mais o favor do rei, foi sentenciado à pena de morte. Ao saber que seria decapitado, o mágico enviou uma carta ao rei. “Oh! Rei poupe a minha vida por um ano, e eu ensinarei seu cavalo a falar. Se eu fracassar, alegremente aceitarei minha decapitação, se tiver sucesso ganharei minha liberdade”. O rei concordou com o repto do mágico e o destinou a passar o próximo ano trancafiado no estábulo real.

  Um nobre que tinha simpatia pelo mágico, certo dia, esgueirou-se na cela do inditoso e sussurrou: “Você é um grande idiota. Você bem sabe que não pode fazer um cavalo falar.”  O mágico respondeu: “Ganhei um ano. Muitas coisas podem acontecer em um ano. O rei pode morrer, eu posso morrer: Talvez, muito talvez, este ano um cavalo possa falar!”

  Pois é, servidor público, a pugna continua. Além das promessas eleitoreiras, muitas coisas podem acontecer neste ano: cavalo falar ou, quem sabe, até voar. Por que não? Afinal, a Bíblia documenta que a burra de Balaão falou!

 A despeito dos pesares, e dessa luta desigual, quero desejar na pessoa do Walter Rodrigues Frois, servidor do INSS, minha solidariedade  a todo aquele que exerce cargo ou função pública neste País e, por extensão, a todo aquele que se deteve a ler esta apoucada opinião. Amplexo!

 * Francisco Assis é professor e pesquisador  Bibliográfico.
E-mail: assisprof@yahoo.com.br

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