O ano 2014 foi declarado por três grupos de pesquisa o mais quente desde 1880, ou seja, a temperatura média da Terra foi maior em 2014 do que nos 134 anos anteriores. Um ano excepcional tem pouca importância, afinal uma andorinha não faz uma primavera, mas os quatorze dos quinze anos mais quentes deste período têm ocorrido desde o ano 2001.
Uma possibilidade é que este aumento seja natural, parte de ciclos naturais – possível, mas pouco provável. Os ciclos conhecidos como solar e do Milankovitch teriam baixado a temperatura. O aumento de gás carbônico, um comprovado gás de efeito estufa, subiu de 315 ppm quando o primeiro autor nasceu em 1951 e agora está próximo dos 400 ppm, um aumento de 27%, sem precedentes nos últimos 800.000 anos. Neste mesmo período, o ciclo global de água tem se intensificado e o período de estiagem no Sul da Amazônia está prolongando e aparentemente ficando mais errático. A Amazônia Sul-ocidental tem sido o epicentro de duas secas severas em 2005 e 2010 com chuvas e inundações se intensificando. O município de Rio Branco tem declarado situações de emergência a cada ano nos últimos seis anos devido a enchentes do Rio Acre.
Mais preocupante ainda é que a queima de combustíveis fósseis, a fonte principal deste aumento de gás carbônico, tem uma tendência a aumentar, acelerando o acúmulo de energia, principalmente nos oceanos, mas também na atmosfera, amplificando ciclos naturais, criando secas e inundações mais fortes. Se continuar este aumento, vamos ter saudades das secas e inundações recentes em comparação às que vêm na frente.
O que fazer numa situação desta? Duas ações simultâneas precisam ser implementadas. Obviamente, precisamos produzir energia e produtos com menos impacto ao clima. Isto seria algo feito nas escalas global, nacional e até local. A segunda ação é se preparar no curto prazo para os impactos crescentes de eventos extremos climáticos.
Para esta preparação a Defesa Civil Nacional, baseada num programa da Organização das Nações Unidas, está promovendo o programa “Cidades Resilientes”, cujo objetivo “…é aumentar o grau de consciência e compromisso em torno de práticas de desenvolvimento sustentável como forma de diminuir as vulnerabilidades e propiciar o bem-estar e segurança aos cidadãos” (http://www.mi.gov.br/cidadesresilientes/).
Este programa baseia-se em dez passos:
1. Estabeleça mecanismos de organização e coordenação de ações com base na participação de comunidades e sociedade civil organizada…
2. Elabore documentos de orientação para redução do risco de desastres…
3. Mantenha informação atualizada sobre as ameaças e vulnerabilidades de sua cidade… Garanta que os cidadãos de sua cidade tenham acesso à informação e aos planos para resiliência, criando espaço para discutir sobre os mesmos.
4. Invista e mantenha uma infraestrutura para redução de risco…
5. Avalie a segurança de todas as escolas e postos de saúde de sua cidade…
6. Aplique e faça cumprir regulamentos sobre construção e princípios para planejamento do uso e ocupação do solo…..
7. Invista na criação de programas educativos e de capacitação sobre a redução de riscos de desastres, tanto nas escolas como nas comunidades locais…
8. Proteja os ecossistemas e as zonas naturais para atenuar alagamentos, inundações, e outras ameaças… Adapte-se às mudanças climáticas recorrendo a boas práticas de redução de risco.
9. Instale sistemas de alerta e desenvolva capacitações para gestão de emergências em sua cidade, realizando, com regularidade, simulados para preparação do público em geral, nos quais participem todos os habitantes.
10. Depois de qualquer desastre, vele para que as necessidades dos sobreviventes sejam atendidas e se concentrem nos esforços de reconstrução…
Em outubro de 2013, o município de Rio Branco aderiu ao programa Cidades Resilientes. O Município que abriga 46% da população acreana, aprendeu a conviver com os riscos, através de ações preventivas, como o Plano Municipal de Redução de Riscos, e com os desastres (estes sucessivos e intensos desde 2009), desenvolvendo-se institucionalmente e priorizando as ações de defesa civil em seu calendário de gestão. Um exemplo desta priorização foi a realização de um exercício simulado de desastre que ocorreu em 2013 e mobilizou o poder público e comunidades, visando preparar-se melhor caso desastres venham a ocorrer.
A execução de políticas públicas voltadas para a redução de riscos de desastres, logicamente, cabe ao poder público, em suas diferentes esferas. O programa “Cidade do Povo” é um exemplo concreto e efetivo de uma política pública voltada para a redução de riscos de desastre. Neste programa, a grande prioridade é a remoção de mais de 3.000 famílias de áreas consideradas de riscos na cidade de Rio Branco.
A redução de riscos de desastres (RRD) e o desenvolvimento de uma cultura de resiliência fomenta na comunidade a ampliação da percepção de riscos. Esta percepção melhora sua capacidade de preparação e de prevenção a desastres, tornando-a capaz de restabelecer seu moral social, sua dignidade diante dos efeitos adversos oriundos dos danos e prejuízos provenientes de eventos extremos.
Nesse contexto, a sociedade surge como o divisor de águas nas decisões de qual futuro quer alcançar quando o assunto é desastre e a redução de seus riscos. O envolvimento da comunidade no desenvolvimento de uma cultura de resiliência pode significar o sucesso ou o fracasso. Nossas ações ou omissões enquanto cidadãos nos direcionarão para um desses caminhos. Lembre-se do ditado: “se você pensa que não pode ou se você pensa que pode, de alguma forma você está certo. Mas, por favor, pense sempre que você pode”.
* Foster Brown, Pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente do Curso de Mestrado em Ecologia e Manejo de Recursos Naturais (MEMRN) da Universidade Federal do Acre (UFAC). Cientista do Experimento de Grande Escala Biosfera Atmosfera na Amazônia (LBA), do INCT SERVAMB e do Parque Zoobotânico (PZ) da UFAC. Membro do Consorcio Madre de Dios e da Comissão Estadual de Gestão de Riscos Ambientais do Acre (CEGdRA).
George Luiz Pereira Santos, Tenente Coronel do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Acre e Coordenador de Defesa Civil Municipal de Rio Branco, Acre.