O futuro do Acre está na Piscicultura. Muitos acreanos ainda não estão familiarizados com esta ideia. Afinal, é difícil acreditar que o peixe pode mudar a economia de um Estado tão explorado em décadas passadas por pélas de borracha e por pastos bovinos. Mas, certamente, até os descrentes já viram os vastos tanques de peixes ao viajar de avião de Rio Branco ou ouviram falar numa coisa chamada Complexo de Piscicultura. Desperta a curiosidade. Agora é hora de conhecer mais uma parte deste empreendimento: a Fábrica de Rações.
A fábrica é totalmente automatizada e possui um layout funcional baseado em um processo produtivo semelhante ao de vários produtos industrializados. Produtos consolidados nas prateleiras de supermercados de todo o país, como ração de gatos e cachorros, e salgadinhos (Cheetos). Ela tem uma ampla estrutura de 35 metros de altura e uma nova arquitetura de fábrica, toda plana.
De acordo com o gerente de Operações da Fábrica de Rações, Renato Mandotti, a fábrica está sendo preparada para produzir, inicialmente, 80 toneladas de ração por dia (ou 10 mil t/ano).
Essa marca inicial é suficiente para suprir a demanda do mercado interno e dar o estopim para a exportação, conforme as estimativas da Peixes da Amazônia S/A. Com a fábrica entrando em pleno funcionamento, no futuro será possível ampliar a sua capacidade produtiva, chegando até a 200 toneladas/dia. Para conseguir isso, a fábrica vai precisar comprar até 120 toneladas de grãos, diariamente. E onde eles vão comprar todos estes grãos? Com os agricultores acreanos. Afinal, os pequenos produtores precisam ser incluídos em toda grande indústria que almeja explorar as riquezas naturais de uma determinada região com responsabilidade socioambiental.
Mas por quê uma produção tão grande?
Responder esta pergunta precisa de uma análise melhor dos planos do Acre para com as novas políticas de Piscicultura. Pronto para conquistar o mercado regional de animais de água doce e apresentar ao mundo uma marca exótica de pescados, o Estado quer ter uma indústria peso pesado dos peixes amazônicos. Para tanto, é preciso pensar em todos os detalhes necessários para sustentar esta cadeia produtiva. Um deles é o que alimenta este peixe. O que os engorda.
Caso não haja esta preocupação, os produtores receberão os alevinos, vão jogá-los no tanque e criá-los do seu jeito. No fim, os peixes serão abatidos mais magros e com menos proteínas em sua carne. Isso é ruim. Vai desagregar valor no mercado para o produto. Já com uma ração de qualidade, peixes maiores serão criados e renderão mais carne quando forem abatidos.
A Fábrica de Rações foi inaugurada desde a metade do ano passado, no Dia do Pescador, 29 de junho. Desde então, ela emprega 15 pessoas só para controlar o seu maquinário. Em outras palavras, 15 empregos gerados para os acreanos. E empregos de cargos técnicos/especializados. “O ser humano é essencial neste processo. Nós é que gerenciamos tudo. A máquina faz, só que ela está propensa a falhar. E, neste ramo industrial, não podemos parar, nem falhar”, advertiu Mandotti.
Conheça a produção
O gerente Renato Mandotti conta que o processo produtivo da Fábrica de Rações é prático e complexo. Para conseguir executá-lo, foi necessário muito investimento no treinamento técnico da equipe que vai operar os equipamentos. Essa capacitação foi necessária para garantir a manutenção, a limpeza, os cuidados com segurança, o controle do funcionamento das máquinas e os conhecimentos de mecânica e na parte elétrica de todo o local.
Primeiramente, a fábrica recebe os grãos que vão gerar a ração. Renato conta que estes podem ser: farelo de trigo, milho moído, soja, sorgo, arroz, entre outros cereais. Eles são armazenados em silos específicos e depois passam para os procedimentos de pesagem. O próximo passo é fazer no sistema a formulação da receita para obter a ração. Os grãos, em quantidades definidas, são adicionados a outros ingredientes e seguem para mistura. Depois para o processo de moagem.
A moagem acontece mais de uma vez. Há a primeira moagem e depois a segunda. Cada uma delas vai peneirar os alimentos numa espessura diferenciada. A partir daí, ela vira o que Renato Mandotti chama de ‘Prémix’ (quando são incorporados vitaminas e minerais no produto, itens indispensáveis para a saúde alimentar dos peixes). Daí, entra a ação da exclusora, que parece uma panela de pressão. Na sequência, entra a água, vapor, o ‘flavor’ no spray (traduzindo: ‘sabor’, que é elemento que atrai o peixe para comer a ração) e a gordura realizada a vácuo. Toda mistura feita em um ‘tambor’.
Com estes novos ingredientes, a ração passa para a máquina denominada de ‘canhão’ (que começa a moldar a forma da ração). E termina na matriz, que dá o formato final do produto.
Explicando este passo a passo, parece complicado mesmo, como bem disse o gerente de operações da fábrica. Entretanto, Renato Mandotti acrescenta que todas estas etapas são automáticas. Elas funcionam em cadeia, e são quase simultâneos. “É um processo contínuo. E a fábrica vai operar em full time, ou seja, sem interrupção. Esse modelo é o que foi mais difícil de se alcançar. E tudo é observado pelo nosso painel de controle”, completou Mandotti.
Ração que não afunda é o cenário positivo
Outra preocupação é de gerar um produto de qualidade. E uma ração boa é aquela que não afunda. Ou seja, o peixe vem e a come na superfície da água. Para isso, ela tem que flutuar. Por isso, Renato Mandotti detalha que foi preciso fazer uma inversão no sistema produtivo da Fábrica de Rações sobre a relação de densidade e de massa. Tal elemento é levado em conta no engorduramento da ração (que é o ato de incorporar proteína e gordura).
“Este detalhe é muito importante porque o peixe só se alimentará bem se a ração flutuar na superfície da água. Se afundar, o animal comerá pouco e, assim, a ração não terá seu principal objetivo alcançado, que é engordar o peixe”, descreveu Mandotti.
O gerente também explicou sobre o volume de produção da fábrica, em analogia ao que deve ser produzido de pescados. Segundo ele, a relação que a Peixes da Amazônia S/A utiliza é que 2 kg de ração usados para alimentar os peixes geram em torno de 1 kg de carne produzida, pronta para o abate.
A partir desta Fábrica de Ração, o objetivo central da Peixes da Amazônia é consolidar no Acre uma alternativa de produto industrial completa, pensada desde quando o animal ainda é um alevino, até a sua criação adequada e a efetiva escala industrial.
“O peixe vai conquistar o mercado do Acre. Atualmente, o frango produzido aqui já entrou de forma competitiva no mercado local. E, a partir deste complexo da Piscicultura (que, além da fábrica de ração, tem ainda o Laboratório de Alevinos, tanques de criação e o Frigorífico de Processamento de Peixes), vamos fazer o peixe atingir a mesma valorização na mesa do consumidor acreano. Isso é uma tendência mundial. Em 2025, o consumo de pescados no mundo será de 20% da carne consumida. Aqui não será diferente”, finalizou Renato Mandotti, com boas expectativas em vista para o futuro.