Hoje sou tentado, dada a inércia geral, principalmente das autoridades constituídas, a colocar em prática a insensibilidade do ceticismo de Pirro de Élida (365-275 a.C), doutrina da descrença na capacidade humana de conhecimento da verdade. Nesta crônica quero praticar a indiferença, abster-me de julgar, pois quando opino estou julgando, privar-me de fazer juízo e, sobretudo colocar em prática a Afasia que no grego significa literalmente falta de palavra.
O que dizer, por exemplo, sobre os tais deputados que foram flagrados assistindo pornografia durante votação da reforma política? Nada em absoluto! Afinal, vivemos tempos de vadiagem, pois é notório que jamais houve época na qual os homens se esforçassem tão desesperadamente por divertir-se quanto o fazem hoje. Os festivais de “expressão livre” onde rapazes e moças entram em êxtases, pelo alto consumo de drogas e executam diante da plateia atos sem vergonha, ou sem pudor, de tamanha depravação que não os podemos descrever aqui, nos mostra que o mundo se encontra numa orgia moral como nunca foi vista nos dias de Roma. Então, senhores legisladores, sigam em frente e usufruam, enquanto podem das benesses do erário público. Deixando-se governar e arrastar pelos impulsos, inclinações e paixões. Nada de usar a razão ou a lógica do dever, já que maioria está mesmo é para curtir “os desejos da carne”. Todos, ou quase todos, estamos enquadrados na assertiva de Santo Agostinho: “Certamente, dizia o Bispo, estamos na mesma categoria das bestas; toda ação da vida animal diz respeito a procurar o prazer e evitar a dor”.
E o que dizer sobre a falácia apregoada em alto e bom som, que nestes dias o mundo está experimentando coisas fantásticas. Na realidade, se tivesse algo a dizer, diria que o mundo está mesmo é perdido no meio de um conjunto de dados desconexos e desintegrado, pois salta aos olhos de qualquer leigo a postura passiva e letárgica da sociedade como um todo.
Muito menos, tenho algo a dizer do pessimismo generalizado da raça humana sobre tudo e sobre todos. Uma vez que me faltam palavras, alguém tem dito que esse pessimismo geral guarda estreita relação com o crescente grau de consciência de que a busca do progresso, que se anunciava como vetor da construção de uma utopia de bem-estar e felicidade, revelou-se como ameaça.
Consciência das possibilidades reais de que a humanidade possa se autodestruir, pelo uso de seus próprios engenhos, notadamente a indústria beligerante que se somam as mudanças climáticas e a consequente degradação das condições ambientais. Enfim, como bem assinalou “um tal” Ivan Illich “a taxa de crescimento das frustrações excede muito à da produção”. Fecha pano, diria Rizzo Araújo. Ele mesmo!
Assumir voluntariamente uma postura de suspensão de toda asserção dogmática, como é o meu caso neste breve garatujar, se constitui numa atitude sábia, uma vez que assumir e viver plenamente essa Afasia, ou seja, calar e jamais expressar qualquer julgamento definitivo, traz momentaneamente a alma, uma condição de imperturbabilidade, que não se abate ou se incomoda por nada. Pondo-me à parte de tudo aquilo que pode perturbar ou afetar a minha “serenidade”.
*Pesquisador Bibliográfico em Humanidades.
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