Para muitos estudiosos, a questão agrária brasileira está para a República assim como a escravidão estava para a Monarquia. Analogicamente, o país se libertou quando tornou livres os escravos. Da mesma forma, quando não precisar mais discutir ações de qualquer gênero que envolva a terra, terá alcançado nova libertação.
É engraçado! Tudo no Brasil tem começo, mas, dificilmente tem-se o fim que se espera. A péssima distribuição de terra no Brasil tem razões históricas, e a luta pela reforma agrária envolve aspectos econômicos, sociais e, principalmente, politiqueiros. A questão fundiária atinge os interesses de aproximadamente um quarto da população brasileira que tira seu sustento do campo, entre grandes e pequenos agricultores, pecuaristas, trabalhadores rurais e os sem-terra. Montar uma nova estrutura fundiária que seja socialmente justa e economicamente viável é um dos maiores desafios tanto do Ministério do Desenvolvimento Agrário quanto do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.
Desde 1850 o Brasil vive a problemática do sistema agrário, período em que acabou o tráfico de escravos e o Império, sob pressão dos fazendeiros, resolveu mudar o regime de propriedade. Naquela Os Estados Unidos da América, nessa época, já discutiam a propriedade da terra. Só que os americanos fizeram exatamente o contrário dos brasileiros. Em vez de impedir o acesso à terra, abriram o oeste do país para quem quisesse ocupá-lo, só não tinham esse direito os senhores de escravos do sul. Assim, criou-se uma potência agrícola, um mercado consumidor e uma cultura mais democrática, já que era pautada numa sociedade de milhões de proprietários e não de latifundiários.
A reforma agrária brasileira, não é uma alternativa barata para os cofres públicos. O Governo Federal gasta até R$ 90.000 com cada família que é legalmente selecionada e assentada em um pedaço de terra. Portanto, para promover a reforma agrária em larga escala, e com eficiência e eficácia é preciso destinar uma imensa cifra de reais para este setor. Entretanto, é errado, em nome da impossibilidade de se fazer o máximo, recusa-se a fazer até o mínimo, haja vista, que o preço dessa recusa está aí, à vista de todos: a urbanização selvagem, a criminalidade em alta e a degradação das grandes cidades.
Se o Brasil e, em especial o Acre, quiser resolver metade dos problemas que assolam os mais de 152 projetos de assentamentos acreanos, onde, estima-se que viva mais de 32 mil famílias, então temos que trabalhar sério, deixar a politicagem de lado, os interesses individuais e de grupos políticos e atacar de frente cada problema que assola a vida dos agricultores rurais assentados. Como sugestão, eu diria que temos que formar uma “força tarefa” que envolva o Governo Federal, estadual, municipal, sindicatos rurais, CUT, presidentes de associações e demais representações de classe legalmente constituída, Ministério Público Federal, Policia Federal, Ouvidoria Agrária Nacional, MDA, Promotoria Estadual de Conflitos Agrários, dentre outros. Além disso, existe uma necessidade urgente que não foi atendida até hoje e que é reivindicado por todos os setores que atuam, direta ou indiretamente, no processo agrário. O Acre necessita, pra ontem, da criação de uma vara judicial especializada tão somente na área agrária para que os processos que necessitam de um parecer ou despacho jurídico fluam com mais rapidez e agilidade. Porém, esses órgãos e instituições devem estar inseridos em um planejamento detalhado, inovador e eficiente que trabalhem em consonância com a seguinte pauta: Saber realmente quais são os verdadeiros problemas que imperam nos projetos de assentamentos do Acre e como resolvê-los? Sabemos que são muitos, e que, além da burocracia exacerbada que o estado exerce sobre eles, existe também uma complexidade imensa que envolve cada um. Muitos desses problemas, digo sem medo de errar, o Incra do Acre sozinho não consegue resolvê-los.
Portanto, sem um novo norte que aponte inovação de estratégias, planejamento moderno, reestruturação de todas as superintendências do Incra nos estados, contratação de mais funcionários, liberação de recursos em quantidades adequadas e em tempo hábil e pagamento de salários mais justos aos funcionários, para que possam pensar em fazer enfrentamento a tais problemas, digo, que sem isso, é brincar de fazer reforma agrária.
Sendo assim, se o caminho a ser trilhado não perpassar pelo menos por este prisma, então o final desse velho desafio brasileiro todos já sabem como vai ser e, quem realmente precisa dele para viver com dignidade, vai vê-lo ser anexado à terra do “NUNCA” como muitos que já foram e estão esquecidos no tempo e no espaço da hipocrisia e demagogia da política brasileira.
* Reginaldo Ferreira da Silva é engenheiro agrônomo; Doutor em Ciências; professor e pesquisador da Universidade Federal do Acre; ex-superintendente do Incra/Acre.