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Oficina de conserto deve fechar em três meses e sucata de monitores ainda não tem destino

Paula Vale afirma que a durabilidade dos aparelhos de TV com tubos são melhores.

Computadores, televisões, impressoras, telefones celular, e todos os outros produtos eletrônicos ficam velhos e um dia viram lixo. Ao final da sua vida útil esses materiais devem ser descartados corretamente, isso porque existem substâncias tóxicas na composição desses equipamentos.

Em alguns casos, as pessoas procuram por conserto, mas quando o equipamento não tem reparo, os proprietários acabam deixando os aparelhos nas oficinas.

Em Rio Branco, há mais de 40 anos, Antônio Vale trabalha com restauração de televisores. São mais de 300 aparelhos entre TVs com tubo e TVs com tela plana ocupando a sua oficina. Se não bastasse, no segundo piso, os apartamentos também estão entupidos de monitores.

Em aproximadamente três meses, Vale deve se aposentar e abandonar a oficina. Mas, onde vão parar essas centenas de televisores?

“Meu pai entrou com pedido de aposentadoria. Ele conversou com uma promotora, e ela sugeriu que ele colocasse no Diário Oficial para que as pessoas pudessem vir buscar. Quem vier veio, quem não vier acabou. Ela joga no lixo ou faz o que quiser. Ele não tem interesse nem de venda”, explica a filha, Paula Vale, de 28 anos.

Paula revela que o custo benefício de consertar e vender os aparelhos de TV com tubo não vale a pena para seu pai. “Vamos supor, para vender uma televisão dessa pronta (TV com tubo) você cobra em torno de R$ 400, mas ninguém quer mais comprar. Fora isso. você tem que pagar prefeitura, impostos, tem as peças que precisa mandar buscar. O custo benefício não vale mais. Por isso ele está desistindo dessa área”, lamentou.

No Brasil e no mundo, a velocidade com que as tecnologias são substituídas não acompanha o precário sistema de coleta e reciclagem desses materiais. Hoje, ninguém quer aquele aparelho de televisão enorme, que ocupa muito espaço. Agora, quanto mais fino, melhor.

A filha de Vale afirma que a qualidade e durabilidade dos aparelhos de TV com tubo são infinitamente maiores do que a nova geração de televisores. Por outro lado, a nova geração tem uma durabilidade menor e logo vira lixo.

“Quem compra essa TV com tela plana não dura mais que 1 ou 2 anos. Quem comprou para a última Copa do Mundo já veio trazer para conserto. Já imaginou quando todas essas televisões forem para o lixo? Como vai ser? Porque as outras tinham durabilidade de 20 anos. Já pensou como vai estar o meio ambiente daqui a uns 5 ou 6 anos? Porque isso vai tudo para o lixo”.

Paula acredita que várias partes do aparelho de televisão podem ser reaproveitadas e recicladas. Contudo, esse é um lixo altamente poluente e ainda não se tem a menor ideia do que fazer com ele.

“Temos uma grande opinião sobre essa questão. Todos esses aparelhos serviriam muito. Teriam uma utilidade enorme. O plástico derretido faria telha, faria muitas coisas, além de gerar emprego”, concluiu a filha de Vale.

Lixo eletrônico: O que é? Onde jogar? É possível reciclar?

Professor doutor Diodomiro Baldomero dá explicações

“São considerados lixos eletrônicos os resíduos que têm sua origem a composição de algum tipo de dispositivo eletrônico, seja um chip, uma placa de circuito ou componentes baseados em estado sólido. Estes resíduos também são conhecidos como ‘resíduos tecnológicos’ devido à sua forte composição de eletrônica”, definiu o professor doutor Diodomiro Baldomero.

O destino desses resíduos eletrônicos é quase um desafio planetário. Muitas pessoas ainda desconhecem os riscos que esse tipo de material representa para o meio ambiente e para a sociedade em geral.

“Isto acontece de forma mais expressiva em instituições públicas, onde ficam empilhadas em ambientes geralmente inadequados, por falta de centros ou unidades que realizem o processo de reaproveitamento desses materiais, sendo que no pior dos casos estes acabam em lixões e aterros sanitários contaminando e comprometendo gravemente o meio ambiente”, relatou Baldomero.

Você já se perguntou por que é importante fazer o descarte correto desse tipo de lixo? O professor doutor afirma que dois fatores explicam tal necessidade: reduz a necessidade da extração de materiais virgens como prata, ferro, etc.; e ajuda a minimizar os danos irreparáveis ao meio ambiente.

“O principal risco provocado pelo lixo eletrônico é a contaminação por seu alto conteúdo de ingredientes tóxicos. Os elementos encontrados na maioria de dispositivos eletroeletrônicos são cádmio, mercúrio, chumbo, bismuto, dentre outros. Altamente prejudiciais quando em contato com lixões e aterros sanitários, e contato com o solo acaba contaminando o lençol freático”, pontuou o pesquisador.

Algumas empresas como Phillips, Dell, HP, Tim e Claro, já recolhem seus produtos ao término da vida útil. Ou seja, essas empresas utilizam a logística reversa, que é a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos. “Mais de 90% dos componentes que conformam um dispositivo eletroeletrônico são recicláveis. Por seu conteúdo de metais precisos neste tipo de dispositivos, existem empresas especializadas em realizar a recuperação de metais. Todas eles estão no exterior”.

Baldomero conta que em 2011, um aluno seu realizou um trabalho de iniciação científica e fez um levantamento de empresas e cooperativas que realizavam reciclagem do lixo eletrônico em Rio Branco, mas as notícias não foram animadoras.

“Infelizmente não se encontrou nenhuma entidade dedicada a este tipo de trabalho. Apenas foram localizados alguns catadores de lixo que recolhiam estes equipamentos extraiam as carcaças por serem metálicos e o resto jogavam nas caçambas dos caminhões recolhedores de lixo”, lamentou o professor doutor.

Por fim, o especialista lembra que existe uma normativa que obriga os municípios a implementar sistemas de coleta específica. “O poder público deve incentivar na criação de centro de entrega desse tipo de resíduos (cooperativas de reciclagem). Com isso, o cidadão que possui uma televisão, por exemplo, saberia direcioná-lo para um lugar adequado de descarte e não jogá-lo junto com os demais resíduos sólidos”.

VOCÊ SABE ONDE DESCARTAR O SEU LIXO ELETRÔNICO?
A equipe do jornal A GAZETA foi às ruas da capital acreana para descobrir onde a população está descartando seu lixo eletrônico. A maioria das pessoas entrevistadas sabe o perigoso que esse material representa para o ser humano, sobretudo para o meio ambiente. Só que a falta de informação e de local adequado para o descarte faz com que a sucata eletrônica seja descartada junto ao lixo comum. Veja alguns depoimentos a seguir:

Rio Branco não possui pontos de entrega para descarte de lixo eletrônico

Equipe da A GAZETA flagrou lixo eletrônico descartado nas ruas de Rio Branco

Um estudo realizado pela Associação de Empresas da Indústria Móvel (GSMA) e da Universidade das Nações Unidas apontou que o Brasil produziu 36% do lixo eletrônico da América Latina em 2015. No total, a América Latina gerou 9% do resíduo eletrônico do mundo, e o Brasil foi responsável pela maior parte.

Os problemas gerados por esse tipo de resíduos são muitos. Porém, na capital acreana, assim como no restante dos municípios do Estado, não existe pontos de entrega para descarte de lixo eletrônico. Por enquanto, a solução para esse problema ainda está no papel, no Plano Municipal de Gestão de Resíduos Sólidos de Rio Branco.

“A preocupação maior são esses materiais que tem a composição química muito forte: pilha, bateria, computadores, monitores. Ficamos receosos, pois poderíamos estar incentivando uma cooperativa de catadores para estar fazendo um desmanche para separar plástico, cobre. No entanto, se essas pessoas não tiverem nenhum tipo de informação. Nós podemos estar colocando em risco a contaminação ambiental e a saúde deles. E, com certeza, é um resíduo que tem um valor agregado. Só que aqui a gente está longe destas empresas de reciclagem da região Sudeste, principalmente em São Paulo”, justificou a diretora de Resíduos Sólidos da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos, Silmara Luciano.

Apesar de reconhecer que é uma obrigação da prefeitura oferecer coleta seletiva, Silmara destaca que cabe ao Ministério do Meio Ambiente cobrar os acordos setoriais, que a Política Nacional de Resíduos determinou.

“Sobre o eletrônico, vale a gente mencionar que a política nacional de resíduos sólidos, que existe desde 2010, coloca os resíduos eletrônicos como um daqueles passíveis da logística reversa. O que é essa logística reversa? Pneus, pilhas e baterias, eletroeletrônicos, embalagem de óleo lubrificante, de agrotóxico, e lâmpadas. Aqueles resíduos que você já sabe que têm um potencial contaminante alto, foi designado pela Lei, que era de responsabilidade do fabricante fazer o resgate desse resíduo”, recordou.

No que se refere à coleta de lixo eletrônico em Rio Branco, o que funciona efetivamente é a coleta de pilhas e baterias no Via Verde Shopping. De acordo com a diretora, é seguro fazer o descarte neste ponto de coleta.

“É seguro você levar no ponto de entrega do shopping, onde você paga o estacionamento tem um container específico para descarte. O que queremos agora? Expandir esses pontos, porque não é tudo mundo que vai ao shopping. Colocar na prefeitura, na Oca, em pontos no Centro da cidade. Pilha e bateria não jogue mais no seu lixo comum, porque o coletor não vai ver e esse material vai para o nosso aterro e vai começar a descompensar a quantidade de mercúrio, chumbo, etc”.

No caso de aparelhos celulares, a recomendação de Silmara é levar o aparelho na revendedora ou loja autorizada. “Essa demanda está crescendo muito no Acre. Se você puder esperar mais um pouco, não descarte, pois ainda estamos articulando uma solução. O importante é começar, porque isso vai implicar na mudança de cultura, as pessoas acham que tudo é obrigação da prefeitura”.

Logística reversa
Na capital acreana, a logística reversa de pneus é a única que funciona. O ponto de coleta fica localizado na Unidade de Resíduos Sólidos (Utre). Com o convênio com a empresa Reciclanip, responsável pela coleta e destinação de pneus no país, Rio Branco consegue distribuir a demanda de pneus usados para reciclar.

A diretora lembra que é responsabilidade também das empresas se responsabilizar pelo material que é vendido ao consumidor. Esse é um dos fatores que a logística reversa de eletrônicos não funciona no Acre e em grande parte do país.

“Nesse mundo capitalista, você já compra um celular sabendo que ano que vem você vai comprar outro. Isso vai gerando um acúmulo desse material. Mas as empresas estão se responsabilizando por esse resíduo? Não, porque nós estamos pagando por esse resíduo, porque na planilha de formação de custo, esses produtos têm que ter a logística reversa, já vem cobrando esse serviço. Lógico, cabe a nós cobrar”, questionou Silmara.

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