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Conheça a história do imigrante mulçumano que se apaixonou por uma acreana católica

 Uma história de amor inusitada. Tudo começou quando o senegalês Elhadji Diene, de 28 anos, chegou ao Acre em busca de refúgio, em 2015. Ele foi um dos 50 mil imigrantes que entrou no país pela rota de imigração acreana, mas diferente dos outros que seguiram para diversos estados, Diene decidiu ficar.

Logo no primeiro mês hospedado no abrigo, que funcionava na Chácara Aliança, em Rio Branco, o imigrante conheceu a voluntária Edinéia Guimarães, de 34 anos, conhecida como “Maninha”. Aos poucos, os dois construíram uma amizade. Ela ajudava os estrangeiros durante a retirada de documentos e serviços bancários.

Os dois trocavam segredos e sempre estavam juntos. Maninha esteve ao lado de Diene em vários momentos, inclusive quando ele resolveu criar uma espécie de república para abrigar os conterrâneos que ainda entram no país pelo Acre.

O sentimento de amizade deu lugar à paixão e há quatros meses o senegalês se declarou para a acreana. “Sempre fomos amigos. Ele disse que meu jeito de ser e meu coração grande foi o que despertou esse sentimento nele. Eu nunca imaginei, porque nós erámos amigos de verdade”, falou Edinéia.

Engana-se quem pensa que o imigrante quer ficar apenas namorando. Ele é mulçumano e ela católica, e, apesar da diferença de religião, o casal já planeja o casamento. A cerimônia deve acontecer em dezembro deste ano e será conduzida por um padre e um orador mulçumano. Por enquanto, Diene aguarda a documentação chegar de Senegal para dar entrada no processo de casamento no cartório.

“Estou muito ansiosa. Vai ser um casamento diferente, fora da igreja, porque ele não pode entrar lá, a religião dele não permite. Nós já fizemos até o curso de noivos”, explicou Maninha.

Durante a conversa, Maninha mostrou que a diferença religiosa não atrapalha o relacionamento e no momento de fazer uma foto beijando o amado ela disparou: “Ele está fazendo jejum, não pode beijar, só abraçar. Dependendo do dia, só dormimos juntos”, disse bem humorada.

Edinéia conta que o pedido de casamento pegou toda a família de surpresa, pois ela foi casada durante anos com um homem que a violentava. A relação foi traumática e deixou a mulher com medo de se relacionar mais uma vez. “Eu tinha medo de sofrer e ele foi me conquistando aos poucos. Ele dizia que era diferente e eu falava que todo homem era igual. Com o jeitinho dele, ele me conquistou. Até agora tem dado certo”.

Hoje, o casal trabalha com venda de produtos de higiene, perfumes, chips de celular e confecções, enviadas diretamente do Senegal. Além disso, os dois administram a república e encaminham os imigrantes que passam pela capital acreana.

 

Herança cultural

Tímido, Diene conta em poucas palavras que, após o casamento, deseja levar Maninha para conhecer sua família e sua cultura. E por falar em cultura, Maninha diz que a culinária senegalesa é deliciosa. “Eu viciei na comida deles e não consigo mais comer a comida daqui de casa. É um arroz diferente. Já tentei descobrir a receita, mas não consigo. Eles usam muita cebola e muita pimenta. Eu não resisto. A comida deles é maravilhosa”.

A gastronomia tipicamente senegalesa é, com certeza, a herança cultural que a acreana se apropriou. Ela também diz ser fã do artesanato produzido pelos imigrantes. “Sempre uso essas peças que eles fazem. Quero muito conhecer o país deles”.

 

República abriga senegaleses durante a retirada de documentos

A república montada por Diene abriga cerca de 75 senegaleses, atualmente, segundo ele. O imóvel alugado fica na Rua Doutor Mário Maia, bairro Defesa Civil, em Rio Branco. De acordo com Maninha, a rotatividade de imigrantes é grande. Os senegaleses ficam na Capital por aproximadamente uma semana, tempo necessário para a retirada de documentos, como CPF e Carteira de Trabalho. Depois, os estrangeiros seguem para outros estados brasileiros.

“Muita gente pergunta de onde eles tiram dinheiro para viajar. Eles recebem de outros imigrantes que estão trabalhando em outros países. O dinheiro é depositado e eu levo eles ao banco para retirar dinheiro. Quando começam a trabalhar aqui eles enviam dinheiro para a família no Senegal.”

De acordo com a Secretaria de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh), mais de 140 senegaleses deram entrada no estado este ano. O secretário Nilson Mourão afirma que o local conta com apoio da Pastoral da Imigração. “Os imigrantes continuam entrando, mas agora exclusivamente senegaleses, os haitianos não vêm mais”.

 

Dia do Imigrante

Em alusão ao Dia do Imigrante, celebrado neste domingo, 25, a Pastoral da Imigração vai promover uma festa para os estrangeiros que estão hospedados no abrigo. A festa vai contar com dança, música e muita comida típica.

Aproveitando a data, Mourão recorda a chegada dos imigrantes no estado. Entre 2010 e maio de 2015, mais de 50 mil imigrantes entraram no Brasil pelo Acre, segundo o secretário. Os estrangeiros chegavam ao Brasil em busca de uma vida melhor e com esperança de ajudar os familiares que permaneciam em seus países de origem.

Para chegar até o Acre, os imigrantes, em sua maioria, saíam da capital haitiana, Porto Príncipe, de lá pegavam um ônibus até Santo Domingo, na República Dominicana, que fica na mesma ilha. Lá compravam uma passagem e seguiam até Panamá,onde pegavam um avião ou ônibus para Quito, no Equador.

“Nossa ação foi uma ação pública de governo com a concepção de que a imigração é um direito humano. Todo mundo tem direito de mudar de lugar e procurar melhorias para sua vida. Recebemos e fizemos tudo que foi possível nesse período. Nós não nos arrependemos do que fizemos, muito embora eu tenha sido muito criticado por muita gente”.

A Gazeta do Acre: