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Cada um é instrutor, menos eu

A inusitada frase é do escritor japonês Eiji Yoshikawa, falecido em 1962, aos 70 anos. E me inquietou desde que a li pela primeira vez.
Podesoar, a princípio, enigmática e até incoerente. Mas parece-metão instigante que nunca deixei de refletir sobre ela. Entendimento em construção, assim a desvelo: ser humano, sou aprendiz e, como tal, tenho como tarefa observar o mundo e me instruir sobre a vida.
Para que se realize esse estudo, sirvo-me, por exemplo, dos procedimentos que verifico nas pessoas.Quando bem-sucedidos,constato o que funciona, o que é bom. Entendendo como “bom” aquilo que beneficia todos e promove a vida.
Então, ao assistir a alguém que se porta de maneira sincera, generosa, benevolente, eu aprendo, mesmo porque examino os frutos dos seus atos. Mesmo sem perceber, essesujeito está me educando.
Mas também me esclarecem aqueles que têm atitudes egoístas, ignorantes ou destrutivas, porque identificoo prejuízo que derramam sobre o seu entorno, e inevitavelmente sobre si próprios.

 

“É sempre superficial e ilusório o ganho particular que custa o sofrimento alheio”

 

Dedicam-se a obter ninharias, inclusive de grande vulto, mas nunca encontram paz ou gratificação verdadeira.Porque é sempre superficial e ilusório o ganho particular que custa o sofrimento alheio.E assim, tomando o malfeitor comoprofessor, certifico-me de como não devo agir.
A natureza também é mestra, grandiosa e sublime. Por isso atento às suas leis, ciclos, dinâmicas e compensações. E, ainda, lúdicas conselheiras, as crianças ensinam o tempo todo, com alegria, inocência, lucidez e criatividade.
Por outro lado, quando afirmo que não ocupo o papel de instrutor, isso não quer dizer que ninguém possa aprender com as minhas atitudes. E nem que eu não tenha desenvolvido virtudes ao longo da vida. Pois, se faço o que amo, ofereço o meu melhor a todo o planeta e essa contribuição não costuma passar despercebida.
Entretanto, para garantir a integridade do meu exercício, devo recolher a pretensão egoica de ser reconhecida como mentora, para não dar vazão à vaidade. Porque esse sentimento me causa ilusão de superioridade e, portanto,distorce a minha percepção do que é real, atraindo o erro, a humilhação e o sofrimento.
Daí o meu respeito a esse precioso princípio, de execução permanente: cada um é instrutor, menos eu.

 

Onides Bonaccorsi Queiroz é jornalista, escritora e autora do blog verbodeligacao.wordpress.com
E-mail: onides.queiroz@gmail.com

Fabiano Azevedo: