Aos mais desavisados, foi sancionada desde o final de abril uma lei, a nº 13.654, que altera dispositivos importantíssimos dos crimes de furto e roubo. Aí você pensa, leitor, que se tratam de medidas mais duras, enérgicas contra ladrões e furtadores. Que finalmente esse Brasil está tomando vergonha e endurecendo o combate legal ao crime. Não está. Pelo contrário, a lei afrouxou ainda mais a punição de infratores de roubo.
O ponto mais problemático dessa Lei 13.654 é a revogação do inciso I do §2º do art. 157 do Código Penal. Antes da lei, o código pregava como causa de aumento de pena para o crime de roubo, de um terço até a metade, no caso de ser a violência ou grave ameaça exercida com o emprego de arma. Esse termo “arma” tinha por entendimento de que poderia ser de qualquer tipo. Um ladrão que assaltasse com uma bigorna (já que esta pode causar sérios danos à saúde de uma pessoa, usada com esse intento) já poderia ser enquadrado nesse dispositivo, ou seja, já haveria causa de aumento em sua pena.
Agora, a lei alterou esse entendimento, trazendo em seu lugar o §2-A: uma causa de aumento de pena de dois terços “se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo”. A nova redação é clara quando substitui “arma” por “arma de fogo”. Significa que, a partir da lei, se o ladrão estiver praticando o roubo com o emprego de faca, facão, terçado, motosserra, ou até uma espada, já fique ciente, leitor, de que não haverá causa de aumento na pena dele.
O entendimento da lei 13.654 é só se for com o uso de arma de fogo. Não é que o legislador não sabia a diferença. Era a intenção dele mesmo. Simples assim. O que não é tão simples são os efeitos que isso provoca na sociedade. Assim como na polêmica decisão da prisão em 2ª instância no STF, a nova lei é um amparo legal não só para quem passa a praticar roubo daqui pra frente, mas para quem já praticou roubo com arma branca antes e teve essa causa de aumento de pena.
Como assim? Isso pode? Nosso Direito Penal é o único que tem um movimento diferenciado no tempo. E, lógico, que assim o faz para beneficiar os réus. Excepcionalmente, é permitido que a Lei Penal retroaja no tempo para alcançar fatos passados. Tem-se essa possibilidade.
Em resumo, ao invés de rediscutir e reformar nosso Código Penal no sentido de atender aos anseios da sociedade brasileira de lutar, dentro do campo da legalidade, contra as facções e outros derivados do crime organizado, estamos indo é na contramão. Estamos dando base legal para soltar criminosos, tendo como pano de fundo a superlotação em presídios.
E quem, em sã consciência, permitiu isso? Eles, nossos congressistas. Antevendo a repercussão negativa, a Lei 13.654 sequer foi votada em plenário pelas Casas do Congresso. Teve êxito só nas comissões temáticas, e já valeu. E no dia 24 de abril, o nosso celebre presidente Michel Temer, especialista em Direito Penal como ele só, sancionou essa lei inconsequente e imoral. Tudo na surdina, bem discreto, assim como é decidido quase tudo que é importante para o povo brasileiro.
* Tiago Martinello é jornalista.
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