Com tudo, absolutamente tudo, mudando tão rápido, você já parou e pensou como ficarão as transações comerciais no futuro?
O varejo, como o conhecemos hoje, vive uma crise sem precedentes. Entre 2015 e 2017, cerca de 226 mil estabelecimentos fecharam as portas, segundo um levantamento da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). “Passa-se o ponto” tornou-se um cartaz mais presente do que muitas marcas. A recessão que varre o país não pode ser responsabilizada por um número tão avassalador. Está claro que não há uma verdadeira e completa compreensão do fenômeno. Pelo contrário. Ouve-se que o comércio eletrônico tem boa parte da culpa e especialistas do varejo, quase todos, apontam os remédios: tecnologia, tecnologia e tecnologia.
Em uma análise mais profunda e estruturada, fica claro que há diversos fatores em jogo. Quem quiser sobreviver como comerciante terá que compreender os novos caminhos e, rapidamente, mudar. Terá que reinventar-se, reconectar-se a um consumidor antenado e mutante, proporcionar novas e encantadoras experiências de consumo e, claro, também adotar novas tecnologias para vender em um mundo digital.
Donos de estabelecimentos comerciais que estiveram sempre pressionados entre os fabricantes e os consumidores, sentem-se agora esmagados por mais essa revolução. Se antes era indispensável visitar um varejista para, digamos, escolher o piso da sala de casa, hoje é possível e prático fazer isso diretamente no site do fabricante, sem intermediários. O varejista precisará transformar-se em empresário capaz de prover experiências, como pisar em uma sala pavimentada com aquela cerâmica, tatear, ver como a luz incide sobre a cor. No futuro deveríamos ouvir a seguinte conversa:
“Ontem fui comprar o piso da sala de casa.”
“Ah! E o que você sentiu?”
Algumas empresas saíram na frente, empenhadas em oferecer valor em forma de experiência. A Bass Pro, varejista americana de acessórios para atividades outdoor, como caça, pesca e canoagem, instalou em uma de suas lojas um gigantesco aquário com peixes onde os clientes podem testar as varas de pescar. Nenhum e-commerce conseguiria se aproximar dessa sensação real.
A indústria, por sua vez, percebeu que precisa se aproximar dos consumidores para compreendê-los e fabricar produtos e serviços que apaixonam, e está descobrindo que o varejo é o caminho certo para isso. Quem se sentia seguro classificando-se como B2B está desesperado em busca de uma “B2Cização”. Recentemente, fiz uma palestra para empresas do setor têxtil em Santa Catarina. Ao final, o diretor de uma grande fábrica levantou a mão e me perguntou: “Professor, o senhor fala em inovação. Bacana, mas 68% de nossas mercadorias escoam por meio de pequenas lojas chamadas armarinhos, que estão morrendo. Precisamos ajudá-las. Como a inovação pode fazer isso?”
Gostei demais da pergunta. Esse mesmo armarinho conhece seus clientes intimamente, no entanto, não colocou a inovação como prioridade. Muitos sequer possuem as práticas necessárias para gerenciar o negócio, e menos ainda a tecnologia. Em outras palavras, tem um ativo maravilhoso chamado conhecimento dos clientes e, de outro lado, um passivo gigante no campo da gestão.
Para salvar os armarinhos, aqui apresentados como metáfora de todo um setor do comércio agonizante, será preciso aplicar-lhes uma dose de gestão, combinada com inovação e foco no encantamento dos clientes. Tecnologia tem, sim, um papel importante, mas há muito mais para mudar. Layout das lojas, iluminação, vitrines, capacitação maciça dos trabalhadores, fachadas, tudo isso pode contribuir surpreendentemente para resultados.
Em uma competente iniciativa, o Governo Federal decidiu estruturar por meio da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, ABDI, ligada ao Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, MDIC, um laboratório brasileiro de inovação do varejo, que apoiará gratuitamente os empresários que desejarem empreender suas revoluções. Lá, sem qualquer custo, vão receber as “armas” de que precisam para vencer.
A proposta de valor para o varejo passará a resgatar as emoções do comprar. Fazer os corações dos clientes baterem forte de novo, como quando éramos crianças e saíamos com nossos pais para as compras de Natal. Entregar momentos inesquecíveis como aqueles. Afinal, comprar é, e continuará sendo, um dos grandes prazeres da vida, que telas e computadores jamais serão capazes de entregar.
*Valter Pieracciani é empresário, escritor e sócio-diretor da Pieracciani Desenvolvimento de Empresas, consultoria especializada em Inovação.