A doença provocada pelo novo coronavírus (nCoV) foi nomeada pela sigla COVID-19. Iniciada na província de Hubei, que tem como capital a cidade de Wuhan – China, a doença supera em número de mortalidade os surtos provocados por outras variedades de coronavírus, como a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS-CoV), ocorrido em 2002/2003 e a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV), ocorrido uma década após. Essa não será a nossa última pandemia e, portanto, surge a pergunta: o que deveremos aprender e fazer para reduzir o impacto de futuras doenças?
A pandemia pelo novo coronavírus poderia ser prevista há pelo menos cem anos, desde que a pandemia do vírus Influenza A, do subtipo H1N1, conhecida como “Gripe Espanhola”, infectou 500 milhões e matou pelo menos 50 milhões de pessoas em todo o mundo, no início do Século XX. Novas epidemias eram apenas uma questão de tempo.
Discorrendo sobre este tema, Bill Gates, num vídeo produzido em 2015 e visto mais de 3 milhões de vezes, concluiu que ainda não estamos preparados para lidar com uma pandemia, ou seja, uma epidemia que afete a humanidade, disseminada em escala global. Isso já está acontecendo com o novo coronavírus com mais de 100 países com casos confirmados.
Os dados, até o momento, indicam que a COVID-19 causará um grande impacto econômico global. O Banco Mundial estimou que uma pandemia semelhante à de 1918 poderia causar na atualidade, danos e custos a nível mundial de três trilhões de dólares, bem mais do que todo o Produto Interno Bruto do Brasil em um ano. Como exemplo, as companhias aéreas poderão perder mais de cem bilhões de dólares este ano, caso o COVID-19 continue a avançar. Alguns economistas preveem uma recessão global causada pela doença, sem falar nos danos por todas as mortes associadas.
A China, conhecida como a fábrica do mundo, após epidemia pelo novo coronavírus, reduziu drasticamente a sua atividade industrial, observada pelo decréscimo da emissão de poluentes e consequente melhoria da qualidade do ar nessas áreas, monitoradas por imagens de satélites.
O modo de raciocínio humano é primariamente binário, ou seja, oscilamos entre reações absolutas, como sim ou não, bom ou ruim, seguro ou inseguro, etc. Este sistema é parcialmente efetivo e serve para nos proteger da maioria dos perigos cotidianos, para decidir se devemos fugir ou lutar, mas não nos ajuda quando avaliamos situações de natureza mais complexa.
Como está reagindo a população mundial frente a esta e a futuras pandemias? Em sua maioria oscilam entre a negação do problema ou o pânico. Ambas atitudes levarão ao mesmo resultado – ações de combate menos eficientes e eficazes, maior sofrimento e muitas mortes desnecessárias.
Em primeiro momento, deveríamos pensar na redução da propagação do novo coronavírus, representada por ações de prevenção primária (Promoção à saúde + Proteção específica) e prevenção secundária (Diagnóstico precoce e tratamento imediato + limitação do dano).
A propagação de uma doença pode ser calculada, indicando quantas pessoas um determinado paciente infectado provavelmente contaminará, ou seja, o número básico de reprodução, representado pela letra (R). Se o resultado (R) estiver em valores acima de 1, cada paciente infectado transmitirá a doença a pelo menos uma outra pessoa e causará o crescimento do número de casos. Se o (R) for menor que 1, um grupo de pessoas infectadas contaminará menos pessoas e a epidemia acabará.
Do ponto de vista do planejamento de políticas de saúde, ele fornece um objetivo muito claro. Por exemplo, na epidemia de Ebola em 2014, o cálculo do (R) foi uma parte importante de avaliação e controle das ações de saúde. O objetivo era obter o (R) abaixo de 1.
O (R), no sentido mais simples, depende da resposta a poucos fatores: (1) quantas pessoas por dia estão em contato com a pessoa infectada? (2) quais as chances desses contatos serem infectados? (3) há quanto tempo que a pessoa infectada está circulando?
Este número pode ser complicado para calcular, mas a sua base conceitual serve para analisar o que podemos fazer para reduzir o potencial de transmissão de uma doença e, no caso de uma epidemia, é onde entra as ações da Defesa Civil nos planos de contingência e mitigação.
É obvio que precisamos isolar pessoas já doentes, objetivando reduzir o número de contatos por dia (1) e o tempo de contato (3). Para as equipes de saúde que cuidarão desses pacientes, é absolutamente necessário fornecer e fiscalizar o uso de EPIs – Equipamento de Proteção Individual, adequados para reduzir o fator (2).
Reduzir o potencial de transmissão do novo coronavírus na população assintomática, necessitará da colaboração e organização de todos – algo que também faz parte do conceito da “Defesa Civil”.
Vamos precisar coordenar efetivamente as atividades coletivas como atividades escolares, recreativas, esportivas e culturais, etc. Garantir a manutenção de serviços essenciais como tratamento e fornecimento de água, energia elétrica e combustíveis, segurança pública, engenharia de trânsito e transportes, fornecimento e distribuição de alimentos, etc. Simultaneamente, garantir a segurança ocupacional e a plena operacionalidade das equipes de assistência e serviços de saúde.
No caso específico dos Estados que compõe região de fronteira, como o Acre, torna-se imperativo estabelecer planos de contingência e cooperação internacional. Mais do que tudo, vamos precisar ajudar os nossos vizinhos – nos bairros e na região – a solidariedade vai ser um elemento de sobrevivência neste admirável mundo novo, junto com bondade, empatia e coragem.
Vamos terminar com as palavras do Diretor da Organização Mundial da Saúde quando declarou no dia 5 de março que “…os planos de emergência começam com a liderança máxima [governador e prefeitos], coordenando todas as partes do governo, não somente da saúde, mas da segurança, financeiro, comércio, transporte, informação e outros – o governo todo.”
“Ativar os seus planos de emergência que envolve o governo inteiro [lê-se uma abordagem da defesa civil e gestão de riscos]. Educar o público para que o povo saiba quais são os sintomas e como se proteger e proteger os outros…”
“Se os países agem agressivamente para encontrar, isolar e tratar os casos [da COVID-19] e traçar cada contato, eles podem mudar a trajetória desta epidemia. Se usamos a abordagem de que não há nada que possamos fazer, isto vai rapidamente se tornar verdade. [A decisão] está nas nossas mãos…”
“Isto não é simplesmente uma ameaça para pessoas individuais ou países individuais. Estamos juntos nesta situação e somente juntos podemos salvar vidas.”
Irving Foster Brown – Pesquisador do Centro de Pesquisa de Woods Hole, Docente de Pós-Graduação e Pesquisador do Parque Zoobotânico da Universidade Federal do Acre.
Paulo Henrique Sampaio Valadares – Médico, Especialista em Saúde Pública (UFAC), Mestrando em Ciências da Saúde na Amazônia Ocidental pela Universidade Federal do Acre – UFAC