Domingo, comecei o dia com um bom humor que fazia tempo, viu? Demorou pra entender de onde vinha, inclusive. Eu já ia no fim do café da manhã quando me dei conta. Era o cheiro. Cheiro de protetor solar. Desses de corpo, sabe? É que fez calor esses dias por aqui, e aí que deu pra voltar a pegar sol na varanda de casa. Tanto tempo que eu não pegava sol. O cheiro me lembrou a praia, o mar.
Ando com saudade de mar. A última vez que estive assim, dentro da água salgada, foi em janeiro de 2020. Parece que faz 10 anos. Era outra vida. Vocês também estão com a sensação de que, embora o tempo esteja voando – e se arrastando também, como pode? -, cada dia tem valido por uns 30? Um mês por dia. Sendo assim, a essa altura, comemoro amanhã o quê? Setenta e três anos! E olha que nasci em 78, não é justo. Há dias em que me sinto assim, viu? Juro pra vocês. E há outros em que sambo enquanto tiro os pratos da máquina, como ontem.
Conversava com uma amiga que anda contente na semana que passou. Ela estava na reunião semanal da empresa. Tudo no virtual ainda. Em janeiro, chegou um diretor novo no departamento de comunicação, ela é do de finanças. São pares. Nunca se viram ao vivo, todos em home office e não há chances de puxar uma conversa como haveria, caso estivessem presencialmente no escritório. Sem elevador, café, corredores, estacionamento e toda aquela coleção de possibilidades de encontro. Ela, de olho nele. “Rô, é educado, bonito, sabido e tenho quase certeza de que é cheiroso”. Pois que, ao fim da reunião, a equipe foi desconectada dos computadores, um a um (23 deles), enquanto os dois seguiam parados, um olhando para o quadradinho do outro. Quando já estavam somente eles dividindo a tela do monitor, o moço tomou coragem e pediu: desliga não. Se brincar, descobriu esse fim de semana mesmo se a suposição olfativa fazia sentido.
Ela contou todos os detalhes da conversa com a voz e os suspiros de uma menina de 15 anos. Idade em que nos conhecemos. Para no final dizer que sente culpa pela própria felicidade. “O mundo acabando, Rô, e eu aqui falando de uma paquera. Desculpa”.
Disse a ela e digo também a vocês. Não. Não se desculpem. É bonito lembrar que estamos vivos. É poderoso. O Julián Fuks falou lindamente sobre isso no texto Se eu não puder dançar essa não é a minha revolução. E como fala lindamente o Julián. Ele diz da associação indevida entre a alegria e a inconsistência: “A gente não corre o risco de esquecer os males”. Não mesmo. Com os 73 recém adquiridos, com os 43 de fato, eu os convido. Bora dançar minha gente, paquerar, passar protetor, tomar sol. E também cuidar de não esquecer do que está acontecendo. Temos espaço pra tudo isso junto. Boa semana, queridos.
Roberta D´Albuquerque é psicanalista, autora de Quem manda aqui sou eu e escreve semanalmente para A Gazeta do Acre e outros 17 veículos no Brasil, Estados Unidos e Canadá.