“O trabalho do ator depende da sensibilidade dos outros. Você vive na memória enquanto existe memória. E enquanto se lembrarem dos personagens que fiz, não vou morrer”, disse ele na ocasião.
Morto nesta quinta, aos 85 anos, em decorrência de complicações causadas pela Covid-19, Tarcísio Meira também não acreditava em idade –e, por isso, não pensava em interromper a longeva carreira de ator tão cedo. Lembrando o ator e diretor Ziembinski, ele dizia que não iria “deixar a bola cair”.
Entre os projetos que ele ainda pretendia tocar, estava um existente havia mais de 20 anos, uma turnê com um espetáculo confessional ao lado da mulher, Glória Menezes, que também contraiu Covid-19.
A inspiração vinha de um caso vivido há um quarto de século, durante a estreia da comédia “E Continua… Tudo Bem”, de Bernard Slade. Por causa de um problema técnico, a dupla precisou entrar em cena para distrair o público enquanto a situação não era resolvida. Decidiram, então, contar histórias que tinham vivido juntos.
Tarcísio Meira parecia estar pronto para voltar a fazer teatro também ao lado de uma geração mais jovem. Lembrando a cerimônia do prêmio Shell de 2016, o ator disse que não conhecia mais ninguém. “Achei que aquela não era minha turma. Depois entendi que ali estavam todos os meus colegas, mais jovens, mas com a mesma fome de palco que eu. Não penso em parar também por isso, por tê-los ao meu lado”, afirmou.
O eterno galã da televisão brasileira tinha consciência de seu papel de veterano. Dizia que agora ocupava o lugar das pessoas que um dia estiveram à sua frente e que já se foram. “Agora quem está na frente sou eu. É um pouco triste, mas é a vida e não há o que se fazer. O fim é inevitável.”
“O Camareiro”, do dramaturgo sul-africano Ronald Harwood, trazia Tarcísio Meira no papel de um ator de idade avançada. Doente, tinha dificuldades de se locomover e lembrar as falas daquela que seria sua última peça, “Rei Lear”, de William Shakespeare.
Ele não tinha certeza se daria conta do papel e precisou ser convencido a pisar novamente nos palcos para aquela produção dirigida por Ulysses Cruz. “No fim, deu certo, mas pensei que seria muito difícil viver uma história que também é um pouco a minha, sabe? Lidar com questões tão próximas, como o fim da carreira”, disse ele, à época aos 83 anos.
Ele também aproveitou a ocasião para opinar sobre as propostas de mudança envolvendo a Lei Rouanet e os projetos que são financiados com ela. “Querem acabar com ela sem entender o que ela faz e já fez pelo Brasil, e isso é muito cruel. Um povo sem cultura não tem identidade. E eu não sei como o teatro vai sobreviver sem a Lei Rouanet, é praticamente impossível.”