O filósofo e teólogo Rubem Alves (1933-2014) dizia que as crianças ignoram os relógios. Os relógios têm a função de submeter o tempo do corpo ao tempo da máquina. Mas, as crianças só reconhecem os seus próprios corpos como marcadores do seu tempo. Se as crianças usam relógios, elas usam como se fossem brinquedos.
Essa reflexão “filosófica” de Rubem Alves mostra a subjetividade da criança enquanto criança. O objeto para ela é só um brinquedo. Mas, isso era antigamente, Mestre Assis! De fato, antigamente, no tempo em que menino era menino, e menina era menina, as brincadeiras de criança, dentre tantas, eram “pular corda”; “pira bola”; “barra bandeira” que envolviam meninos e meninas. Contudo, havia brincadeiras de exclusividades do menino (jogar futebol) e da exclusividade das meninas (brincar de roda, e de boneca). De um lado o clube do Bolinha, do outro, o da Luluzinha. Essas brincadeiras, no máximo deixavam, não raras vezes, escoriações ou luxações no corpo dos infantes, mas nada que não fosse sarado com o bom “mercúrio cromo” e/ou “sebo de Holanda” também chamado de “sebo de carneiro”.
E hoje? Bem ou mal, hoje quase 90% das crianças e adolescentes possuem um potente celular, que vai dos 16 Gb (Giga bytes) ao potentíssimo 256 Gb, através do qual o mundo infantil tem acesso aos fantásticos jogos virtuais. Estão “ligadaços” a uma rede mundial de informação. São milhões de crianças usuárias da internet.
Em pesquisa sobre o assunto, se constata que é nas classes econômicas mais altas a maior proporção de crianças que acessam a internet. Já nas classes socialmente menos favorecidas, a incidência é menor, no entanto pela falta de estrutura familiar a desgraça, quando acontece, é maior.
Os pais de família, com a vida social melhor organizada, quase num patrulhamento, vivem a indicar para os filhos os portais seguros, ativam filtros de controle de conteúdo e colocam limites para a exposição das crianças a todo tipo de mídia, incluindo games e televisão. Os pais sabem que celulares mal usados, pelas crianças, pode levá-las a um mundo de ilusões e trazer grande sofrimento ao corpo e a alma dessas vidas ainda em formação. Pode destruí-las moral e psicologicamente. Neste caso não há “mercúrio cromo” e “sebo de carneiro” que cure!
Menos mal, que há pessoas, a exemplo da cientista americana e engenheira de dados, Frances Haugen, que nesta semana, revelou que os aplicativos de comunicação instantâneos, são um veneno para crianças e adolescentes. Especificamente, no caso do Facebook, Instagram, etc., porque os lucros estão acima da segurança dos usuários e do público em geral.
Mesmo considerando que a internet, presente no dia a dia das crianças e adolescentes, traz benefícios para o desenvolvimento educacional dos jovens, fato comprovado em tempos de pandemia com a aprovação do ensino remoto, o alerta da cientista Frances Haugen, surge em hora oportuna.
Mesmo num mundo, de novos valores, em que parece que a criança não é mais criança, deixo aqui os meus votos sinceros, ou sinceros votos, de que as crianças, as de hoje e as de amanha, continuem tendo o direito de ser criança!
*HUMANISTA. E-mail: assisprof@yahoo.com.br
“Os pais sabem que celulares mal usados, pelas crianças, pode levá-las a um mundo de ilusões e trazer grande sofrimento ao corpo e a alma. Pode destruí-las moral e psicologicamente.”