Não é de hoje que o Acre chama atenção do resto do Brasil e do mundo. As aldeias indígenas tem atraído cada vez mais admiradores e pessoas interessadas na valorização desta cultura. Como o grupo de líderes de São Paulo, que visitou o Estado, nesta semana, acompanhados do líder espiritual Prem Baba. Com o intuito de escutar as demandas de lideranças indígenas e de aprender sobre a cultura, o grupo diz que pretende ajudar a fortalecer a preservação amazônica, a medicina dos povos originários e conectar conhecimentos.
Durante 10 dias, os cinco visitantes foram até o Rio Croa, onde se encontraram com delegações dos povos Shanenawa e Yawanawa. Nedina Yawanawa, da terra indígena do Rio Gregório, foi uma das representantes que falou, entre outras questões, sobre as dificuldades enfrentadas a partir de políticas públicas fragilizadas. Ela destacou a ausência de representação indígena na política e como isso provoca o aumento de projetos de leis que flexibilizam legislações ambientais e prejudicam a preservação das terras indígenas e sua cultura, como o Marco Zero.
“Nós saímos muito satisfeitos, muito felizes e esperançosos de realizar projetos para fortalecer ações que já existem e ampliá-las”, comenta Nedina, que é coordenadora da Sitoakore – Organização de Mulheres indígenas do Acre Sul do Amazonas e Noroeste de Rondônia.
Outra pauta levantada pelos povos foi o intercâmbio de boas práticas entre povos indígenas e a valorização da medicina natural. Pontos que logo devem ser concretizados em São Paulo, segundo a Secretária de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia da cidade, Patricia Ellen.
“Sobre esse investimento em pesquisa, todo trabalho medicinal tradicional dos indígenas, foi muito rico no combate à Covid-19 e no tratamento da população nas aldeias. Isso precisa ser mensurado, estudado e quantificado. Então, fazer um estudo científico para que possamos mostrar a beleza desse trabalho, como isso pode ser utilizado em escala para salvar vidas é muito importante”, afirma Patricia.
A poucos dias antes de participar da COP 26, conferência mundial para delimitar medidas sustentáveis, Patrícia defende ainda a importância dessa troca de experiências e reforça que a questão da Amazônia é algo do Brasil e não apenas local. Nas viagens internacionais, os questionamentos sobre o trabalho de proteção da região e o compromisso dos governos é questionado com frequência, ela afirma.
“Fazer essa imersão na prática acho que é o mínimo que nós temos que fazer como gestores públicos e, obviamente, traduzir isso em passos concretos (…) E lembrando a importância desse momento da COP: essa representação internacional para acesso a recursos internacionais, para promoção e advoga-se desse resgate da cultura indígena, que está acontecendo de uma forma tão bonita no Acre (..) Esse pontos, a gente pretende encaminhar, institucionalmente através dos órgãos de governo que representamos, mas também através do engajamento do setor social, do terceiro setor, do setor privado e trazer de forma harmônica o envolvimento de todos esses atores”, destaca.
Para poder compartilhar e divulgar todo este conhecimento com o mundo, além de gerar controle das próprias terras, a conectividade é uma das chaves que os representantes dos povos indígenas também abordaram. “A internet é muito cara na aldeia. É uma necessidade a ampliação e o fortalecimento da comunicação dentro das comunidades indígenas. Isso não vai se perder (culturalmente), mas se tornar um meio para ajudar a população indígena”, afirma Nedina.
Este foi um dos diálogos firmados com André Barrence, diretor do Google para Startups na América Latina. Ele afirma que a empresa deve gerar iniciativas para startups desenvolverem produtos e serviços na região amazônica, incluindo o Acre. André acredita que a empresa pode contribuir com a infraestrutura de internet, gerando mais conectividade.
“Acredito muito nesse elemento de conectá-los cada vez mais, preservando também sua forma de vida e autonomia (…) Além de formas de você usar a tecnologia para fazer o monitoramento de tudo o que está acontecendo em relação ao desmatamento (…) E os povos indígenas são os grandes guardiões dessa terra e aí você dar a eles um ferramental tecnológico para que junto a sua própria capacidade de atuar no território eles consigam ser mais assertivos para prevenir esse desmatamento é também um tema muito importante”, afirma.
‘Chamado espiritual’
Mestre espiritual e autor de três livros, Prem Baba explica que seu trabalho é o de despertar a consciência do propósito das pessoas. Neste grupo, ele acredita que esta vinda marcou um “chamado” para poder usar seus conhecimentos e repertório a favor da causa da Amazônia, que é fundamental para a sociedade humana, ele reforça.
“Entendo que meu trabalho é dar essa consciência e envolver essas pessoas que estão prontas para essa causa do bem, da justiça, do equilíbrio, da saúde, do meio ambiente e de preservação e proteção dos povos originários”, comenta.
Estes são alguns dos pontos que Gustavo Arns, idealizador do Congresso Internacional de Felicidade busca abordar ao reunir palestrantes do Brasil e do mundo para exporem suas visões sobre o que é a felicidade, a partir da ciência, da filosofia, da arte e da espiritualidade. Ele identifica fortes relações entre ciências que estudam a felicidade e os saberes do povos da floresta.
“Talvez a gente não precise buscar uma resposta tão longe, como em Harvard, a gente tem uma resposta em casa, que é a compreensão dessas raízes ancestrais, que já trazem respostas muito profundas sobre esses temas, e acho que esse resgate vai nos auxiliar nesse processo de cura mesmo, de encontro com nós mesmos, de florescimento, de saúde”, reflete.
Reconhecendo a relevância deste conhecimento, Fábio Toreta, superintendente de comunicação da Sabesp (empresa de saneamento de São Paulo), não deixou de buscar vias de diálogo, mesmo em período de férias.
“Questão latente no Sudeste, existe um conhecimento que demonstra que o desmatamento na Amazônia, as queimadas, podem impactar no padrão de chuvas no sudeste – criar um intercâmbio para a gente possa trabalhar de maneira mais colaborativa com as lideranças locais”, destaca.
Toda essa troca e vivência foi realizada com a ajuda do acreano Bento Marques, desenvolveu um sistema de práticas integrativas entre saúde alimentar, física e espiritual. Morando em São Paulo desde 2019, ele ficou amigo de Prem Baba e tem ajudado na busca pela proteção da Amazônia.
“Está tudo acontecendo de forma bem espiritual e natural esses movimentos (…) Vou costurando e ajudando a abrir os caminhos junto aos povos indígenas e, para isso, precisa ter muita proteção e muita confiança, que eles têm em mim”, declara Bento.
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