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‘O povo indígena está aberto ao desenvolvimento, desde que seja com a floresta em pé’, diz pajé acreano que participará de conferência da ONU

Cada vez mais, o conhecimento xamânico dos povos indígenas vem sendo apontado como em convergência com o conhecimento científico, que trata por exemplo, das mudanças climáticas. Davi Kopenawa, xamã do povo Yanomami, foi eleito, em 2020, como membro da Academia Brasileira de Ciências, justamente pela colaboração de seu trabalho como líder espiritual com a ciência climática.

Kamarati é o que o povo Noke Kui, conhecidos regionalmente como Katukina, denominam Romeyá: um nome próprio para designar uma pessoa capaz de se comunicar com os espíritos da floresta e transformar a doença em cura. É o que os brancos costumam chamar de pajé. E assim como os brancos também tem seus líderes espirituais, tais como padres e pastores, os indígenas também têm os seus. Eles são como uma memória viva dos ancestrais, e uma espécie de tradutores e diplomatas entre o mundo espiritual e a sua comunidade.

Romeyá Kamarati é o principal convidado da conferência organizada pela Fundação Forest Forces (Foto: Arquivo pessoal)

Por esta razão, Kamarati é o convidado de honra para participar de um encontro em Amsterdã, Holanda, durante a conferência da ONU sobre mudanças climáticas. O encontro acontece nesta quinta-feira, 4. Juntamente com Romeyá Kamarati, uma comitiva do povo Noke Koi participa do encontro sobre as temáticas de direitos indígenas e preservação do meio ambiente.

A participação é um convite da Fundação Forest Forces, com o objetivo de promover um diálogo sobre as perspectivas indígenas na floresta amazônica. O Romeya (pajé – líder espiritual) Kamarati, é o principal convidado dessa conferência organizada pela Fundação Forest Forces do criminologista ambiental Dr. Tim Boekhout van Solinge.

A ativista de Direitos Humanos indígenas, Maya, também é oradora dessa conferência, denunciando o crescente desmatamento na Amazônia acreana, estará apresentando soluções para o futuro. A conferência organizada em Amsterdã, no Teatro Munganga, para ouvir o povo Noke Koi, iniciará as 20h (Holanda) e será transmitida online para todo o mundo.

Também contará com a participação musical do Washme Noke Koi, músico e filho do Cacique Geral do Povo Noke Koi, Cacique Poá. Em Amsterdã, Romeyá Kamarati respondeu a algumas perguntas sobre a sua participação no evento:

Como você vê a importância da participação nesse evento sobre o clima?

É importante porque vamos levar situações, desafios que são vividos na floresta Amazônia não só pelo povo Noke Koi mas por todos os povos indígenas. Os problemas de todos são os mesmos.

Você como uma liderança espiritual, como vê, percebe e entende as mudanças climáticas?

Por exemplo, nós temos construção de torres de energias que irão passar por nosso território. A pergunta é, para que? Não precisamos de mais energia, precisamos de mais floresta. Precisamos de preservar as nossas medicinas, quando se passa com essas construções que só favorecem o não indígena, como é que nosso povo irá viver? Vai ser necessário abrir campo, desmatar mais dentro do nosso território que já não tem muita caça, vivemos em situação de insegurança alimentar por causa dos caçadores invasores, porque a necessidade de destruir mais floresta? Não consigo compreender o caminho que segue o não indígena, derrubar árvores para construir torres de energia dentro da floresta? Isso não é desenvolvimento isso é retrocesso.

Que pensamento tão errado é este que diz que uma torre de energia tem mais valor que uma antiga e ancestral Samaúma?

Qual pode ser a contribuição dos países ricos para ajudar os povos indígenas a continuar preservando o meio ambiente?

Podem investir mais em projetos de desenvolvimento dentro dos territórios indígenas e menos em projetos que não preservam e nem respeitam a vida, o meio ambiente e a floresta.

Podem ajudar as comunidades indígenas a fortalecerem os seus conhecimentos ancestrais, de agricultura, artesanatos, cultura, medicinas, abrindo uma parceria entre dois mundos, um intercâmbio de tecnologias e conhecimentos.

O Povo indígena está aberto a parcerias e iniciativas para o desenvolvimento, desde que seja com a floresta em pé e respeitando o nosso modo de vida.

O que esperar do governo Bolsonaro a respeito dessas questões? Como tem sido para os povos indígenas esse atual governo?

O que falar de um governo que se mostrou desde o início um inimigo da floresta e dos povos floresta? Bolsonaro traz com ele um rastro de destruição. Ele quer destruir as terras indígenas, quer lotear os nossos territórios e entregar para o agronegócio. Violando nossos direitos constitucionais e desrespeitando todos os povos indígenas do Brasil, toda nossa luta, toda nossa história, toda nossa ancestralidade.

Bolsonaro se coloca claramente todos os dias contra os povos indígenas e a favor da destruição dos nossos territórios e ninguém está fazendo nada para pará-lo.

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Agnes Cavalcante: