X

É possível explorar de forma sustentável o mogno (SWIETENIA MACROPHYLLA KING) na floresta amazônica?

Parte 2

Quétila Barros* e Evandro Ferreira**

Como mencionado na primeira parte deste artigo, o mogno tem grande importância econômica para o manejo madeireiro em regiões de florestas neotropicais, e na Amazônia é a espécie com o maior valor no mercado internacional (R$ 17.300/m³ em 2022).

Entretanto, apesar da importância econômica que, em tese, deveria incentivar sua exploração da maneira mais sustentável possível, a verdade é que não existem conhecimentos suficientes sobre o comportamento ecológico da espécie para se afirmar que sua exploração manejada seja sustentável.

Especificamente, pouco se sabe sobre a dinâmica da regeneração natural do mogno em florestas manejadas sob regime de impacto reduzido na Amazônia brasileira.

Com o objetivo de obter mais informações sobre esse aspecto da espécie, realizou-se um estudo em uma Unidade de Produção Anual (UPA) de 1000 hectares na Floresta Estadual do Antimary, no Acre. No local, o mogno tinha sido preservado da exploração madeireira realizada anteriormente sob regime de impacto reduzido.

Em volta de 20 plantas-mãe de mogno com diâmetro superior a 80 cm foram instalados quatro transectos orientados nos sentidos Norte, Sul, Leste e Oeste. Cada um deles media 20 metros de largura por 40 m de comprimento e em seu interior foram contabilizadas, plaqueteadas e medidas todas as plântulas de mogno, desde as recém-germinadas até as com altura de 1,3 m.

Em razão da localização das plantas-mãe, foi possível avaliar a dinâmica da regeneração do mogno em cinco ambientes distintos: floresta inexplorada, nas proximidades de estradas secundárias, de trilhas de arraste e de pátios de estocagem de toras.

Ao longo dos 18 meses de duração do estudo, foram colhidos dados para avaliar a influência de algumas variáveis nas taxas de mortalidade, recrutamento (entrada de novos indivíduos na população florestal) e crescimento das plântulas.

As variáveis avaliadas foram: distância das plântulas até as plantas-mãe, orientação cardeal (Norte, Sul, Leste e Oeste) das plântulas e as características dendrométricas das plantas-mãe (altura total, diâmetro e área de projeção da copa). As características dendrométricas foram coletadas com o uso de tecnologia de escaneamento a laser (LiDAR).

Um total de 1.560 plântulas foram encontradas na área de floresta inexplorada, correspondendo a quase 90% dos indivíduos levantados. Nesse local, a maioria das plântulas foi observada até 15 metros de distância das plantas-mãe, mas alguns indivíduos ocorreram até uma distância de 40 metros.

Nos locais onde houve exploração, a ocorrência de plântulas foi baixa (cerca de 10%), possivelmente indicando que os ambientes alterados pela exploração madeireira (estradas, trilhas de arraste e pátios de estocagem de toras) não favorecem a germinação e o estabelecimento das plântulas.   

A limitação da dispersão das sementes do mogno, mesmo ela sendo feita pelo vento, pode estar relacionada com o peso relativamente elevado dos frutos e sementes. Entretanto, em áreas florestais da Bolívia, México e América Central, a dispersão pode alcançar até um quilômetro de distância em função das catástrofes ambientais (furacões, tempestades severas e incêndios florestais).

Com base nas plântulas encontradas, a maior dispersão de sementes ocorreu na direção Oeste das plantas-mãe. Em todas as orientações cardeais a mortalidade de plântulas foi superior a 50% e o maior percentual de recrutamento foi observado na direção Leste. Estatisticamente, entretanto, os resultados não mostraram diferenças significativas na distribuição da regeneração natural e dinâmica da espécie em função da orientação cardeal.

O maior percentual de recrutamento (20%) foi observado na floresta inexplorada. Nos outros ambientes estudados, apenas nas proximidades de estradas foram observadas novas plântulas em baixa porcentagem (2%).

O porte das árvores (altura, área de projeção da copa e diâmetro a 1,3 m do solo), influenciou a regeneração natural, pois plantas-mãe mais altas e com maiores diâmetros de áreas de copa apresentaram maior número de plântulas em seu entorno. Isso aconteceu possivelmente porque indivíduos com essas características são considerados mais fecundos.

O crescimento em altura das plântulas na floresta inexplorada foi de no máximo 10 milímetros na faixa de distância próxima a 40 metros das plantas-mãe no sentido Oeste. Nas distâncias iniciais em relação às plantas-mãe, o crescimento foi inferior a cinco milímetros.

O baixo crescimento das plântulas nas proximidades das plantas-mãe pode ter ocorrido pelo fato delas terem ocorrido dentro do raio de projeção das copas (algumas recobrindo até 500 m²). Portanto, estas plântulas sofreram maior influência do sombreamento, fator que também foi limitante para a sobrevivências das mesmas.

O maior crescimento de plântulas foi verificado nos indivíduos encontrados nas proximidades de estradas e pátios de estocagem de madeira. Isso ocorreu provavelmente pela maior entrada de luminosidade nesses ambientes.

Além da limitação de dispersão das sementes, alta mortalidade das plântulas e baixa regeneração natural nos ambientes com maior luminosidade (estradas, trilhas de arraste e pátios de estocagem de toras), no segundo ano do estudo apenas duas das 20 plantas-mãe avaliadas frutificaram, não sendo observada a presença de plântulas recém germinadas.

Assim, embora o mogno tenha sido preservado da exploração madeireira ocorrida, e esta tenha criado ambientes favoráveis ao crescimento de plântulas que já existiam na floresta, não houve regeneração diferenciada nos ambientes alterados durante a retirada de outras espécies madeireira.

O estudo concluiu que para se garantir a sobrevivência e o desenvolvimento de plântulas de mogno em áreas submetidas ao manejo florestal de impacto reduzido é indispensável a realização de tratamentos silviculturais como a abertura de dossel florestal, plantios de enriquecimentos e correção da fertilidade natural do solo.

Dessa forma, se pode afirmar que a exploração sustentável do mogno na floresta amazônica utilizando técnicas de manejo de baixo impacto só poderá ter sucesso caso se façam intervenções silviculturais para garantir a sobrevivência e o crescimento de plântulas que, após algumas dezenas de anos, poderão se transformar em indivíduos adultos com diâmetro adequado ao corte.

Para saber mais:

Barros, Q. S. 2016. Regeneração natural do mogno (Swietenia macrophylla King) em área manejada na Amazônia Sul-Ocidental. Dissertação (Mestrado em Ciência, Inovação e Tecnologia para a Amazônia), Universidade Federal do Acre, 88 p.

*Pesquisadora Bolsista PCI-DA | CNPq – do INPA

**Pesquisador do INPA e do Parque Zoobotânico da UFAC.

Evandro Ferreira: Evandro Ferreira é pesquisador do INPA e do Parque Zoobotânico da Universidade Federal do Acre (Ufac). Email: evandroferreira@hotmail.com