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Existe cura gay?

A ativista Karol Eller tirou a própria vida. Era próxima da família Bolsonaro e ocupou cargo comissionado na EBC de 2018 a 2023. Depois virou assessora de um deputado do PL. Era lésbica e no mês passado, participou de um retiro cristão onde se converteu e anunciou a decisão de “abandonar a prática homossexual”, bem como os “vícios e desejos carnais”.

Mas a “cura gay”, como era de se esperar, não deu certo. E ela por fim deixou a mensagem de que havia “perdido a batalha”.

Li deboches como um desrespeito enorme a quem sofre de depressão. Cada coisa inacreditável, de embrulhar o estômago, coisas que não se justificam de forma alguma.
Também pode-se sentir que a esquerda está se tornando a direita ao contrário, não é de hoje que aviso isso.
Por mais que seja incompreensível, ao menos para mim alguém gay sendo Bolsonarista, fiquei impressionada e triste com o desfecho dessa história. Já frequentei igreja evangélica, sei o peso de perfeição (impossível de alcançar) que se impõe sobre os fiéis, em geral. Não consigo nem imaginar sobre uma pessoa LGBTQI+.
A questão da cura gay é simplesmente terrível. Existem vários depoimentos públicos de pessoas devastadas por esses rituais. É desumano.
Pesquisei depoimentos dela dizendo coisas como “Deus me ama, mas não ama as minhas práticas” e achei TÃO triste a culpa escancarada que sentia por sua verdadeira orientação sexual. Acaba comigo porque sei que é como muita gente se sente, independente de preferências políticas, essas pessoas poderiam ser felizes simplesmente aceitando que amor é amor e pronto. Que ninguém deve ou pode ser julgado por seus afetos e desejos. Simples assim, nem consigo levar a opção política dela em conta porque nesse caso não influencia, tem gente de todos os lados sofrendo.

Penso que não faz muito sentido quem se manifesta para dizer que “não vai lamentar” a morte de Karol Eller. Se não era alguém por quem você tinha apreço, claro que não precisa lamentar. Mas debochar também não, né? Gente, a morte dessa mulher sinaliza algo terrível, que esses rituais de “cura gay” estão acontecendo por aí, deixando um tanto de gente bitolada. Fazendo pessoas sucumbirem à angústia de não conseguir o impossível: deixar de ser quem se é. A gente devia se importar com isso sim.
Pior do que não se sentir aceita pela sociedade é não ser aceita por si mesma.

Beth Passos
Jornalista

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