Por Alceu Ranzi e Evandro Ferreira
A Brasileira: Angelina
Entre tantas heroínas acreanas, a maioria anônima em sua labuta nos altos rios, sobressai o nome de Angelina Gonçalves. Natural da cidade cearense de Aracati, veio para o Acre com o marido Sebastião Ferreira de Sousa no final do século XIX, fugindo da seca no Nordeste. Essa mulher extraordinária lutou, ao lado de Plácido de Castro, contra as forças do Exército Boliviano na tomada de Volta da Empresa.
“Logo após o primeiro combate do seringal Volta da Empresa, ocorrido em 18 de setembro de 1902 em Rio Branco, vencido pelos soldados bolivianos, consta na historiografia que as moradias de todos os que habitavam o povoado foram invadidas na busca pelos revolucionários fugidos. E, numa pequena casa do lugar conhecido como Forte de Veneza, onde hoje se encontra o bairro Cidade Nova, os soldados bolivianos entraram atirando e vitimando fatalmente um homem enfermo.
Ao ver seu marido covardemente assassinado, Angelina tomou a arma de um dos soldados e disparou contra eles no exato momento que entrava na casa o comandante boliviano coronel Rojas, atingindo-o no ombro. Ao ver seu chefe atingido, os soldados bolivianos voaram sobre Angelina, querendo trucidá-la imediatamente. Ao que se ouviu a voz do comandante ferido que ordenava: “Libertem-na. Mulheres assim não se matam. Se o exército acreano tiver dez homens tão corajosos como essa mulher, já perdemos a guerra”.
“Há relatos afirmando que ela se tornou uma feroz combatente, chegando a fazer com que o coronel Plácido de Castro tivesse muito trabalho para contê-la e impedir que estivesse sempre à frente dos combates que se seguiram”.
“Historiadores brasileiros se encarregaram de tornar Angelina uma heroína da revolução e de uma forma ou de outra, a história de Angelina Gonçalves é importante por revelar a participação de diversas mulheres na Guerra do Acre”.
Em reconhecimento a sua atuação heroica e guerreira, o Corpo de Bombeiros Militares do Acre institui a medalha “Bombeiro Militar Mulher Acreana Angelina Gonçalves” para homenagear mulheres que vêm se destacando pelos serviços prestados à população acreana.
A Boliviana: Flora
Do outro lado também se apresentaram mulheres guerreiras. Revisando documentos e livros de autores Bolivianos, encontramos o nome de Flora Salas, nascida na cidade de San José de Chiquitos, no oriente boliviano, enfermeira do Exército Boliviano (1902-1903) com participação no combate final de Puerto Alonso (Porto Acre).
“Se ha evidenciado que la Señora Salas ha intervenido en el combate de Puerto Alonso, hoy Puerto Acre, en calidad de tropa. La señora Salas en compañía de otra jóven, lucharam ambas portando rifles y que además atendieron a los enfermos y heridos durante el sítio y asedio de Puerto Acre”.
Ainda durante o conflito no Acre ela foi feita prisioneira e internada em Manaus. Ao final da guerra retornou para a Bolívia, se radicando na cidade de Riberalta, onde veio a falecer em 1948.
Segundo informa um dos filhos do Sr. Amadeu Barbosa, Jimmy Barbosa, estudioso e detentor de extensa bibliografia sobre “La Campaña del Acre”, a Sra. Flora Salas foi mãe do Dr. Oscar F. Salas, jurista, que foi Ministro da Suprema Corte de Justiça da Bolívia.
Ainda em vida, e por uma Resolução Suprema, a Sra. Salas foi reconhecida como “Benemérita de la Pátria”, criando assim uma figura histórica para os Departamentos de Pando e Beni.
A Paraguaya: Fortunata
“La señora Fortunata de Leite Barbosa, contaba con 45 años de edad, obesa y de pequeña estatura. Es de nacionalidad paraguaya, y su carácter enérgico supo siempre hacerla respetar por los brasileños, entre los que es muy aborrecida” (Achá, José Aguirre – De los Andes al Amazonas).
“A su esposo, el anciano y respetable Capitán Leite Barboza le fue conferido en Acre el título de Coronel boliviano honorario”, tendo sido também nomeado “Juiz Corregedor dos Territórios de Bolivia” (Aponte, 1903). O Capitão Antonio Leite Barboza participou da guerra do Paraguai e foi lá que “contrajo matrimônio en Asunción com Doña Fortunata N., paraguaya”.
Pelo que se pode apurar, o Capitão Antonio Leite Barboza, brasileiro de família tradicional do estado do Ceará, teria chegado em Puerto Alonso em dezembro de 1899 na comitiva boliviana chefiada por Ladislao Ibarra, administrador da Aduana boliviana em Puerto Alonso. Possivelmente por isso, no início da “Questão do Acre” esteve a serviço da Bolívia e durante o conflito (06 de agosto de 1902 a 24 de janeiro de 1903) se manteve neutro – não tomou lado no conflito.
O local de atuação de Fortunata foi o barracão do Seringal Humaytá, “cuyo nombre nos recuerda una de las mejores fortalezas del Paraguay”. Seu marido também era proprietário do Seringal “Curupaithy”, cujo nome homenageava a Fortaleza de Curupaithy, localizada às margens do rio Paraguai e palco de uma das mais memoráveis batalhas da guerra do Paraguai.
“Hacemos mención de estos detalles, por la circunstancia de ser estos esposos amigos de Bolívia; y por haver prestado la señora Fortunata imensos servicios a todos los bolivianos; a cuya consequencia la odiosidad de los brasileños, que no han perdido la ocasión de hostilizarlos. En uno de los compartimientos de su casa se instaló el Hospital Militar, atendido por ella personalmente, por su servidumbre, y allí en familia residió por longos meses el Vice-Presidente (da Bolivia) Señor Velasco” (Aponte, 1903).
“Corazón varonil e inteligencia clara, ella sola es suficiente para poner en armas, como lo hizo a toda su freguesia, que pasaban de 300 individuos y toma las mejores disposiciones para un combate” (Aponte, 1903).
Para saber mais:
Aponte, José Manuel. 1903. La Revolución del Acre en 1902-1903. Imprenta El Comercio de Bolivia, La Paz, 439 pp.
Achá, José Aguirre. 2016 (1902). De los Andes al Amazonas. Recuerdo de la Campaña del Acre, Biblioteca Laboral n° 38, La Paz, 350 pp.
Azcui, Benjamin. 1925. Resumen histórico de las campañas del Acre, 1899-1903. Intendencia de Guerra, Bolivia. 429pp.
Fernandez, Emilio. 1903. La Campaña del Acre (1900-1901). Imprenta Litografia y Encuadernación de J.Peuser. Bolívia, 212 pp.