O texto de hoje está inspirado na palavra saudade, considerada a sétima palavra mais difícil de traduzir em todo o mundo. É uma palavra da cultura portuguesa que não encontra a tradução perfeita em outros idio-mas. Só existe, em português, embora outros povos carreguem o mesmo sentimento que a palavra saudade transporta para nós do mundo da lusofonia.
Há outros vocábulos de difícil tradução, na visão de tradutores profissionais, segundo uma empresa britânica: 1º. “Ilunga” (tshiluba). Uma pessoa que está disposta a perdoar quaisquer maus-tratos pela primeira vez, a tolerar o mesmo pela segunda vez, mas nunca pela terceira vez; 2º. “Shlimazl” (ídiche). Uma pessoa cronicamente azarada; 3º. “Radioukacz” (polonês). Pessoa que trabalhou como telegrafista para os movimentos de resistência o domínio soviético nos países da antiga Cortina de Ferro; 4º. “Naa” (japonês). Palavra usada apenas em uma região do país para enfatizar declarações ou concordar com alguém; 5º. “Altahmam” (árabe).Um tipo de tristeza profunda; 6º.
“Gezellig” (holandês). Aconchegante; 7º. Saudade (português). Sentimento nostálgico, sentir falta de alguma coisa ou de alguém; 8º. “Selathirupavar” (tâmil, língua falada no sul da Índia), palavra usada para definir certo tipo de ausência não-autorizada frente a deveres; 9º. “Pochemuchka” (russo). Uma pessoa que faz perguntas demais; 10º. “Klloshar” (albanês). Perdedor.
Mas o que significa essa palavra saudade? Saudade traz em si diversos significados que podem ser interpretados de acordo com o contexto onde é aplicado. Sua origem encontra-se no Latim, Solitate, e se pesquisada, descobriremos que a conotação contemporânea distanciou-se da original. Saudade não mais se refere ao sentimento de solidão preservado em variações de línguas românicas como o espanhol: soledad e soledat.
Saudade é uma coisa boa. É uma das palavras mais presentes na poesia de amor da língua portuguesa e também na música popular. No entanto, embora tão usada nos dias atuais, só se tornou conhecida a partir do galego-português, quando os trovadores começaram a usá-la para traduzir a mistura dos sentimentos de perda, distância e amor. A palavra vem do latim “solitas, solitatis” (solidão), na forma arcaica de “soedade, soidade e suidade” e sob influência de “saúde” e “saudar”.
Há afirmações de que a palavra foi cunhada na época dos Descobrimentos e no Brasil Colônia esteve muito presente para definir a solidão dos portugueses numa terra estranha, longe de entes queridos. Define, pois, a melancolia causada pela lembrança; a mágoa que se sente pela ausência ou desaparecimento de pessoas, coisas, estados ou ações.
Uma visão mais especifista aponta que o termo saudade advém de solitude e saudar, onde quem sofre é o que fica à esperar o retorno de quem partiu, e não o indivíduo que se foi, o qual nutriria nostalgia. A gênese do vocábulo está directamente ligada à tradição marítima lusitana
Uma visão mais especifista aponta que o termo saudade advém de solitude e saudar, onde quem sofre é o que fica à esperar o retorno de quem partiu, e não o indivíduo que se foi, o qual nutriria nostalgia. A gênese do vocábulo está directamente ligada à tradição marítima lusitana.
A origem etimológica diz que o termo “saudade” foi uma interfluência entre a força do estado de estar só, sentir-se solitário, oriundo de “solitarius”, que por sua vez advém de “solitas, solitatis”, possuidora da forma declinada “solitate” e suas variações luso-arcaicas como suidade e a associação com o ato de receber e acalentar este sentimento, traduzidas com os termos oriundos de “salute e salutare”, que na transição do latim para o português sofrem o fenômeno chamado síncope, onde perde-se a letra interna l, simplesmente abandonada enquanto o t não desaparece, mas passa a ser sonorizado como um d.
Assim, após andar pelo mundo da lusofonia, a palavra saudade acabou por gerar derivados como a qualidade “saudosismo” e seu adjetivo “saudosista”, apegado à idéias, usos, costumes passados, ou até mesmo aos princípios de um regime decaído, e o termo adjetivo de forte carga semântica emocional “saudoso”, que é aquele que produz saudades, podendo ser utilizado para entes falecidos ou até mesmo substantivos abstratos como em “os saudosos tempos da mocidade”, ou ainda, não referente ao produtor, mas aquele que as sente, que dá mostras de saudades.
Conclui-se o texto dizendo que Saudade não tem cor, mas pode ter cheiro. Não podemos ver nem tocar, mas sabemos o quanto é grande. Pode ser o sentimento que alimenta um relacionamento amoroso ou apenas o que sobra dele. Pode ser uma ausência suave ou um tipo de solidão. Pode ser uma recordação daquele momento e daquela pessoa, que um dia, mesmo sabendo ser impossível, ousamos querer reviver e rever. É a dor de quem encontrou e nunca mais encontrará de quem sentiu e nunca mais voltará a sentir. A saudade se combina com outros sentimentos e procria-se. A soma da saudade com a solidão é igual a Dor. O resultado da saudade com a Esperança é a Motivação.
Saudade é uma só, em diferentes palavras. É comum encontrá-la grafada nas lápides em alusão a dor da ausência provocada pela morte. Mas na Literatura e na Música é um tema crônico. É quem arquiteta a estrofe e conduz o tom. Não importa o gênero literário ou o estilo musical, não importa o autor, a época ou a situação.
DICAS DE GRAMÁTICA
Faz cinco anos ou Fazem cinco anos?
– Fazer, quando exprime tempo, é impessoal: Faz cinco anos. / Fazia dois séculos. / Fez 15 dias.
Há dez anos atrás ou Há dez anos?
– Na linguagem culta formal, considera-se um erro de redundância usar há … atrás. Há e atrás indicam passado na frase. Use apenas há dez anos ou dez anos atrás.
Luísa Galvão Lessa – É Pós-Doutora em Lexicologia e Lexicografia pela Université de Montreal, Canadá; Doutora em Língua Portuguesa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Mestra em Letras pela Universidade Federal Fluminense; Membro da Academia Brasileira de Filologia; Membro da Academia Acreana de Letras.