Muito se fala em ser cidadão e ter cidadania, mas tão pouca gente sabe, em verdade, o significado dessas palavras e ainda mais de onde vieram e como chegaram aos dias atuais. Ser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei. É, em resumo, ter direitos civis. É também participar no destino da sociedade, votar, ser votado, ter direitos políticos.
Os direitos civis e políticos não asseguram a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a participação do indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, a uma velhice tranqüila. Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, políticos e sociais, fruto de um longo processo histórico que levou a sociedade ocidental a conquistar parte desses direitos.
Cidadania não é uma definição estanque, mas um conceito histórico, o que significa que seu sentido varia no tempo e no espaço. O conceito de cidadania esteve ligado, durante mais de século, à classe burguesa. Afinal, cidadania vem de “cidade”, e cidadão era o homem que, livre da gleba feudal, habitava a cidade. Assim, “cidadão” e “burguês” eram, a grosso modo, entendidos como conceitos sinônimos. Hoje, cidadão é aquele que convive numa sociedade respeitando o próximo, cumprindo com suas obrigações e gozando de seus direitos.
Da mesma maneira, como cidade era o símbolo da liberdade, em contraposição à servidão feudal, e como seus habitantes não eram nobres aristocráticos de “sangue azul”, a palavra chave que exi-giam era igualdade. Quando a burguesia assume o poder, na Revolução Francesa de 1789, as palavras igualdade e liberdade ganham conteúdo ideológico. E com elas, o conceito de cidadania.
Assim, cidadania é um conceito que adere ao conceito de classe burguesa, não interessando, portanto, às classes antagônicas a ela. Os conceitos de liberdade e igualdade, no ideário burguês, só subsistem aco-plados à propriedade. Assim, para a burguesia, é a propriedade que constitui o homem livre, é a propriedade que constitui os iguais (ou, em contraposição, os que não podem ser tidos e tratados como iguais).
Somente na década de 70 de nosso século a intelectualidade e os chamados intelectuais orgânicos das classes subalternas vão reconstituir o conceito de cidadania, ampliar sua abrangência e reinterpretar os conceitos burgueses de liberdade e igualdade. Foi necessária uma reinterpretação para recolocar o conceito de cidadania como conceito universal e como conceito-base para a reconstituição da estrutura social e política.
Cidadania passou a ser entendida como o ato de o homem constituir-se como homem entre outros homens e como homem que, com os outros homens, constrói o mundo humano, material e simbólico em que subsiste. Ser cidadão é ser sujeito do processo histórico, em contrapo-sição ao ser objeto, sobre o qual incide a ação do sujeito; é ser agente, produtor do espaço cultural em que deverá viver.
Constituir-se como cidadão é assumir-se protagonista do processo histórico. E, assim sendo, o cidadão não delega responsabilidades, não deixa parte de si para outrem. Ele luta pelo bairro onde está, participa politicamente, não aceita perder conquistas já efetuadas, exige salário digno para aquilo que faz, exige justiça para si e para os outros. Não existe educação senão para a constituição da cidadania plena, quer seja do indivíduo, quer seja da coletividade.
Finalmente, entende-se que ter cidadania é nunca permitir que o dado seja aceito sem a necessária reflexão, sem consciência crítica. Ser cidadão é nunca se permitir ser objeto, mas sim, construtor de seu próprio ser, de sua própria identidade, do seu próprio mundo.
DICAS DE GRAMÁTICA TODOS SOMOS “CIDADÕES”?
– Não! Todos somos cidadãos. O plural de cidadão é cidadãos. Veja outros casos: caracteres (de caráter), juniores, seniores, escrivães, tabeliães, gângsteres.
GOVERNO É CONFUSO E SEM LÍDER, DIZ OPOSIÇÃO.
– O correto é: Governo é confuso e está sem líder, diz oposição.
O verbo ser indica qualidade permanente, o verbo estar qualidade transitória. Por isso, o emprego de um pelo outro.
OBRIGADO!
– No Brasil, há o costume de retribuir o agradecimento com um “Obrigado você”, que é inadequado. Se se quiser responder dessa maneira, deve-se usar “Obrigado eu”, ou “Obrigada eu”, se for mulher, “Obrigados nós”, ou “Obrigadas nós”, ou ainda “Obrigado(a) a você”. Se não quiser usar expressão alguma das apresentadas, pode-se responder com a frase “Eu que agradeço”.
Luísa Galvão Lessa – É Pós-Doutora em Lexicologia e Lexicografia pela Université de Montreal, Canadá; Doutora em Língua Portuguesa pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Mestra em Letras pela Universidade Federal Fluminense; Membro da Academia Brasileira de Filologia; Membro da Academia Acreana de Letras. [email protected]