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Japão: bravura indômita!

“O Japão, há séculos, suporta pacientemente essas calamidades e emerge das ruínas à força de trabalho e bravura”.

No princípio, parafraseando gênesis 1.1, diz a mais velha das fábulas japonesas, havia os deuses. Nasciam macho e fêmea e morriam, até que por fim dois deles, irmão e irmã, receberam dos mais velhos a tarefa de criar o Japão. Diz, ainda, a lenda que de sobre a flutuante ponte do céu, lançaram no oceano uma lança. O cravamento da lança  fez espirrarem 4.223 gotas, que é o número de ilhas do arquipélago. Então, nasce o Japão que por sua injunção geográfica, estava predestinada à dominação dos mares. Terra propícia a vegetação, pois que é rica em chuvas e névoas nutridoras de pequenos rios torrentosos. Suas montanhas desenham-se artisticamente, em linhas quase perfeitas, como as do Fuji. A propósito o monte Fuji (fogo) teve sua última erupção em 1707.  Historia-dores são genéricos em afirmar que, não há dúvida de que estas ilhas são produtos  dos terremotos e não, como quer a lenda, do cravamento da lança no oceano. Nenhuma outra terra, nem mesmo a América do sul, sofreu e sofre tão dolorosamente das convulsões do solo.

Autoridades no assunto de terremotos ou abalos sísmicos dizem que o atual terremoto foi o maior desde a Segunda Grande Guerra Mundial. Contudo, a história dos terremotos no Japão é milenar: No ano 599 a terra tremeu e engoliu aldeias; meteoros caíram, cometas brilharam e em pleno julho a neve revestiu as ruas, sobrevieram à seca e a fome; milhões de japoneses morreram. Em 1703 só em Tóquio um terremoto matou 32.000 pessoas. Em 1885 essa cidade foi novamente destruída; grandes fendas  se abriram, tragando milhares de criaturas; os mortos eram enterrados em massa. No terremoto de 1932 morreram 100.000 pessoas em Tóquio e 37.000 em Yocohama. Kamacura foi quase totalmente destruída. Em todos esses eventos catastróficos, os japoneses, apesar de assombrados e muitos se dizendo abandonados pelos deuses, jamais pensaram em abandonar  aquele perigoso jihpen ou o lugar onde nasce o sol.

Conta-se que, no passado, no dia seguinte deste grande terremoto de 1932, as crianças  usavam as telhas  como lousas e os fragmentos de argamassa ou caliça ressequida, que sobraram do flagelo, como lápis. O Japão, há séculos, suporta pacientemente essas calamidades e emerge das ruínas à força de trabalho e bravura.

Os efeitos dessa catástrofe que está acontecendo no Japão causam apreensão aos países do primeiro mundo, assustados com as explosões e vazamentos  das usinas nucleares de Fukushima. A possibilidade da proliferação da radiação traria prejuízos incalculáveis às nações poderosas. A preocupação, justificada, nos remete a uma pitada de cogito filosófico: Mesmo com o progresso e todas as conquistas tecnológicas, o homem, em muitos momentos, entra em desespero por ser incapaz  de controlar o uso dos engenhos  que ele próprio criou.

Estive no fim do passado mês de fevereiro, obviamente que deste ano em curso, na cidade de Londrina-Paraná. Mesmo em meio as minhas atividades acadêmicas, pude notar com satisfação o bom padrão de vida, especialmente na região central, que goza os habitantes da bela “Londres”. As casas e prédios residenciais; os  edifícios públicos ou particulares, todos bem cuidados; bem como, dá gosto ver e andar nas ruas e avenidas, com trânsito, tanto de pedestres e de veículos, humani-zados. Em Londrina, pelo visto, não têm entre seus 510 mil habitantes nenhum “pixador”, esses vândalos que atendem pela alcunha de grafiteiros e que existem aos montões nas grandes cidades do sudoeste brasileiro. A cidade é limpa! Monologuei: de qual raiz cultural vem ou virá essa educação social; essa disciplina e respeito por esta cidade?
Andando pelo calçadão comercial, nas horas de folga,  notei a presença, em muitos negócios, do cidadão japonês. Eles estão lá com sua organização e  trabalho disciplinado. Gratos aos deuses, pela terra que os acolheu. Depois fui informado que há, só no Norte do Paraná (Londrina, Maringá, etc.) 156 mil japoneses. Muito da prosperidade do antigo berço da produção de café no Brasil, devemos aos irmãos japoneses.
Neste momento de agruras e de incertezas que assolam a nação nipônica, são meus desejos que os ventos aquecidos e as correntes do sul que se misturam com o ar frio das montanhas do Japão,  tragam paz  e faça ressurgir nos corações dos irmãos japoneses, a milenar bravura indômita.

* Francisco Assis dos Santos é professor e pesquisador  bibliográfico em Filosofia e Ciências da Religião. E-mail: assis prof@yahoo.com.br

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