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O empate que marcou a história e a ousadia de Marlene Mendes


A data foi 14 de maio de 1988. A madrugada terminou sombria, iluminada pelas porongas que rompiam a escuridão. Foi um dia quente na floresta acreana. Não apenas pelo calor, mas pelas tensões que cerravam os semblantes de uma gente simples, humilde, talvez de pés descalços, mas de um coração guerreiro e sangue apaixonado. Quando a razão deixou de ser ouvida, quando os argumentos sensatos foram calados pela presença de jagunços e policiais armados, a coragem e o amor pelo chão em que pisaram precisou gritar mais alto.

Foi então que a seringueira Marlene Mendes tomou uma decisão ousada: propôs colocar as crianças e as mulheres à frente dos homens, todos lado a lado para defender a floresta da qual tiravam o sustento. Sem poder lutar com armas de fogo, usaram a armas que tinham para impedir que a “jagunçada” invadisse a casa que moravam e derrubassem todos os sonhos no chão. E foi assim que todos os seringueiros, unidos, cantaram o hino nacional.

O gesto de coragem, hoje reverenciado como um feito heróico, foi decisivo para que o movimento dos seringueiros, então liderados por Chico Mendes – que meses depois seria assassinado – tivesse vitória. Na noite desta quinta-feira, 26 de setembro, o Governo do Estado e Comissão Especial “25 Anos Chico Mendes Vive Mais” homenageou a seringueira que ajudou a registrar na história o último empate feito em Xapuri. Marlene Mendes, prima de Chico Mendes, recebeu a reverência do governo e os cumprimentos do governador Tião Viana e da primeira-dama, Marlúcia Cândida, por sua luta em defesa das florestas acreanas.

A homenagem merecida
Marlene Mendes é prima de Chico Mendes e filha de dona Cecília Mendes, a matriarca do Seringal Cachoeira, que faleceu neste ano. Ela ainda vive no Seringal Cachoeira, ao lado da família. E no entardecer desta quinta-feira, subiu as escadarias do Palácio Rio Branco  acompanhada pelo governador e a primeira-dama. Mas ela não deixou para trás a simplicidade que a gerou. Ainda é a mesma guerreira de sempre e seus olhos continuam refletindo a humildade de quem respeita a floresta.

“Essa homenagem significa a coragem que nós tivemos e toda nossa luta. Nós lutamos muito. Perdemos o Chico Mendes, mas não perdemos a floresta. Nossa luta valeu a pena. O Chico foi um rei seringueiro e no seu coração tinha muita força. Ele trouxe a floresta até aqui e continua vivo pra todos nós”, disse Marlene.


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