(Foto: Gleilson Miranda/SECOM)
Rua Rui Barbosa, Centro de Rio Branco, 10h15 de quinta-feira, 10. A manhã é de muito calor e aparenta tranquilidade, que em breve será perturbada por tiros, pelo som de sirenes e gritos de pânico. Na casa lotérica Trevo da Sorte, em frente da Praça do Bebódromo, 21 pessoas, a maioria prejudicadas com a greve dos bancários, se amontoam nas filas para pagar contas. Nem imaginam que vão viver dali a pouco tempo, os momentos mais terríveis de suas existências.
Dois homens, o presidiário Moisés Nascimento Silva, 22, armado de pistola e um indivíduo identificado por Antônio Feitosa, de revólver em punho, invadem o local com o objetivo de levar dinheiro dos caixas.
Moisés Silva, no primeiro gesto de extrema audácia, fecha as portas da loja com todos dentro. Uma mulher, Eliana Nascimento, participa como ‘olheira’ do grupo, a que indica as facilidades de acesso. Ela se passa por vítima e depois figura entre os primeiros libertados.
“A situação, naquele momento, foi de muito medo, mas eu já estava saindo e empurrei a porta com força contra um deles, antes que ele fechasse totalmente. Escapei por um milagre”, narra com exclusividade à reportagem de A GAZETA, Francisca de Oliveira, a última pessoa a sair da lotérica, no exato momento da chegada dos bandidos.
E por mais de 6 horas, os bandidos se tornam os ‘donos das vidas’ de 21 inocentes. Começa um jogo de gato e rato – entre polícia e bandidos – que acabou com a rendição do trio, às 16h35, depois de exaustiva negociação mediada por três oficiais especialistas em negociação de reféns.
Neste meio tempo, o clima foi de terror no interior do estabelecimento. Espancamentos por chutes e coronhadas, alternados com tiros de intimidação para cima, fizeram parte do cardápio do terror oferecido pelos bandidos. Algumas vítimas mais debilitadas foram liberadas, entre elas idosos, uma mulher grávida e uma garota de 17 anos.
“Eles estão batendo muito”, contou a um site local Arlete Alves, cuja irmã, Maria Aparecida Alves também foi refém e posteriormente, libertada.
A intervenção policial foi feita imediatamente após a invasão dos bandidos, por uma equipe do Grupamento de Intervenção Rápida Ostensiva, o Giro, da Polícia Militar. Eles foram acionados por dois policiais civis que perceberam o movimento estranho de fecharem as portas naquele horário e com pessoas no interior da lotérica.
Atiradores de elite da Polícia Militar foram chamados imediatamente a assumir postos de vigilância e ataque nos prédios dos arredores, enquanto o policiamento normal isolava área, ambulâncias do Samu eram posicionadas na Avenida Marechal Deodoro. Ali, uma loja de óculos serviu de sala para atendimentos de urgência. Era para onde iam os eventuais feridos por tiros. A ação causou engarrafamentos em torno do Centro da cidade e demais regiões.
Os bandidos exigiram comida só para eles e um carro para fugir. Avisavam, a todo momento, que estavam dispostos a matar se preciso fosse e que “não tinham nada a perder”. Foram aconselhados pelos negociadores a desistir e libertaram vários reféns.
(Foto: Gleilson Miranda/SECOM)
Os acusados – Os dois homens acusados de liderar a ação criminosa têm passagem pela polícia. Moisés Silva já tinha sido recolhido quando era menor, sob acusação de homicídio. Ele respondia por uma condenação por tráfico de droga e estava foragido do sistema prisional.
A polícia investiga se a mulher era funcionária da empresa assaltada. Há suspeitas de que Eliana teria sido contratada há pouco tempo e infiltrou-se na empresa para passar informações privilegiadas para a dupla. (Colaborou Resley Saab, editor de A Gazeta)
(FotoS: Cedidas)
Três oficiais negociam com os assaltantes e cedem algumas exigências
(Foto: Gleilson Miranda/SECOM)
O primeiro negociador a chegar ao local foi o capitão Cristian Moura Diogo e como manda o protocolo iniciou a negociação com os assaltantes.
Ele conseguiu a liberação de 10 reféns em troca de três coletes balísticos e água. Horas depois entra em cena como negociador o coronel Douglas. Ele consegue a liberação de mais cinco reféns e disponibiliza um veículo para os assaltantes, que foi posicionado no cruzamento das ruas Marechal Deodoro e Rui Barbosa. O carro fica com as quatro portas abertas, além do bagageiro.
Depois, os assaltantes exigem almoço. O pedido também é atendido, e por volta das 15h30, entra em cena o terceiro negociador: capitão Geovanne.
O oficial não libera mais nenhum pedido dos assaltantes e negocia somente a rendição, com garantias de integridade física e acompanhamento de familiares.
Às 16h30, os bandidos decidem pela rendição. O primeiro a se entregar é o presidiário em liberdade condicional Moisés Alves, que cumpre pena por crimes de homicídio e tráfico de drogas. Minutos depois, o segundo assaltante, Antônio da Silva Feitosa, conhecido pelo apelido de “Dunga”, morador do bairro Preventório, e com passagem por crime de furto, também se entrega.
Entenda como ficou o entorno da lotérica
Trânsito causa transtornos à população durante o assalto
(Foto: Brenna Amâncio/ A GAZETA)
O assalto a casa lotérica, além do terror aos reféns, causou caos no Centro de Rio Branco. Quem precisou buscar os filhos na escola ou mesmo aproveitar o horário do almoço, encontrou engarrafamentos por todos os lados.
Assim que o assalto com reféns foi anunciado, autoridades responsáveis isolaram a Avenida Ceará, na frente do Colégio de Aplicação, até o Terminal Urbano. A Rua Marechal Deodoro também foi fechada do Centro Empresarial até o Parque da Maternidade. A Rua Rui Barbosa foi isolada do prédio da prefeitura até o Estádio José de Melo.
De acordo com o coordenador de Fiscalização de Trânsito do Detran/AC, Herbson Sousa, 14 agentes foram mobilizados para a operação de apoio aos profissionais que tentavam contornar o assalto. “As nossas intervenções nos trechos mais críticos começaram às 11h20. O tempo todo trabalhamos tentando orientar as pessoas a evitarem a região central da cidade, até mesmo pela questão de segurança. A indicação era para quem desejasse ir ou sair do Segundo Distrito utilizasse a 3ª ponte, pela Via Verde”, informou.
Durante o horário de pico, por volta das 12h de ontem, o aposentado Orlando Barros, sem saber o que estava acontecendo, reclamava do engarrafamento que o prendia há mais de 30 minutos. “Faz bastante tempo que estou tentando ir para o outro lado, no bairro Estação Experimental. Não estou bem, porque tenho pressão alta. Um trânsito assim fica ruim para mim. Nessa situação, só nos resta ter tranquilidade e esperar o que vier pela frente”, declara.
Assustado com a notícia do assalto, o servidor público Francisco Lima, tentando manobrar o carro no meio do trânsito caótico da Avenida Brasil, contou que chegaria atrasado ao destino por conta disso. “Estou me sentindo péssimo com esta situação. Esses bandidos aprontam uma coisa dessas e ocasionam isso aqui”, retruca ele.
Durante o assalto, o acesso ao Terminal Urbano foi interditado e os desembarques foram feitos na Avenida Ceará, próximo ao Colégio de Aplicação. Para evitar que a população saís-se ainda mais prejudicada e evitar outros transtornos, equipes da Rbtrans atuaram no local para indicar novas rotas aos transportes coletivos.
Governador elogia atuação de equipe da segurança
O governador Tião Viana acompanhou as negociações e ação executada pelos agentes de segurança. Tião Viana agradeceu o empenho dos servidores públicos, agentes de polícia, policiais civis e militares que participaram da ação e confessou que ficou aliviado com o fim do assalto que não teve vítimas fatais.
“A polícia boa é aquela que sabe defender. A melhor técnica e a melhor doutrina foram empregadas nessa ação. Todos os profissionais estão de parabéns. Também agradeço a colaboração da imprensa durante esta operação”, declarou Tião Viana.
Os secretários Reni Graebner, Emylson Farias e o comandante-geral da PM, José dos Reis Anastácio foram recebidos pelo governador no início da noite para avaliar a operação.