Confesso que nossos contatos eram esporádicos, mas isso não significa que deixava de admirar seu talento, sua perspicácia e sua inteligência. Em nossos encontros quase casuais, muitas vezes guardava seus conselhos e seus ensinamentos por longas datas (e na verdade até hoje) porque sabia da sua experiência de vida, que também repassou aos seus três filhos e até mesmo à sua dedicada e valorosa esposa, a Nadir.
Valdo Lopes de Melo, o terceiro de uma “fila” de dez de dona Neide Lopes de Melo e do seu Mansueto Moreira de Melo, nasceu no dia 16 de junho de 1948, lá no seringal Bagaço, no município de Rio Branco, terra destinada a revelar grandes valores e talentos. A realidade da vida o fez passar parte da infância lá no distrito de Mata Fresca, no município de Aracati, no Ceará. Retornou ao Acre, foi para Belém e depois para o Rio de Janeiro, já nos idos dos anos 60 para servir ao Exército Brasileiro, em Marechal Deodoro.
Este grande operador do Direito que nos deixou há um ano fez de tudo um pouco entre a adolescência e a fase adulta. Foi de vendedor ambulante a engraxate, sempre ganhando a vida de forma honesta. Quando deu baixa do Exército, entre os anos de 1967/68, Valdo Melo retorna ao Acre onde ingressa no mundo da música, chegando até mesmo a empresariar o ainda não famoso cantor Odair José (aquele da Feiticeira).
Dos anos que se seguiram ele participa de festivais de música, sempre combatendo ideologicamente o golpe militar de 1964 em Rio Branco, em Porto Velho, em Cuiabá e também em Campo Grande. Sua verdadeira arte, entretanto, ainda não estava na música e ele teria que trilhar um longo caminho até retornar novamente ao seu Estado natal e passar no vestibular de Direito, onde se notabiliza.
Depois que deixa o ramo da música, Valdo Melo vai novamente para o Rio de Janeiro e depois para Cuiabá, onde monta seu próprio comércio. De novo em Rio Branco, abre novo comércio e já aconselhado pelo professor Raimundo Melo, conclui o antigo segundo grau (ensino médio). Essas experiên-cias, contudo, servem somente para mostrar a pluralidade do seu talento e a abnegação que tinha pelo trabalho.
Em 1975, já estudando Matemática, decide fazer o vestibular para Direito, onde é aprovado. Para se manter, ele divide o tempo entre as aulas no campus da Ufac e o escritório da Tecmaq, onde trabalhava como representante comercial. Grande vendedor, ajudou a empresa a fechar bons negócios tanto com o governo e prefeituras, quanto também com a iniciativa privada. Sua dedicação e zelo pela nova profissão garantem a ele uma aprovação imediata no exame da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Acre (OAB/AC), com o número de inscrição 400.
Daí em diante, Valdo Melo dedica-se exclusivamente à nova profissão. Trabalha para o extinto Banco Real e também para o extinto Banacre. Vai para São Paulo, onde faz uma especialização em Direito Securitário e, em poucos anos, se torna uma das grandes referências do Direito Civil e Comercial de nosso Estado.
Mas o destino ainda tinha uma desagradável surpresa para ele. Já em 1988, Valdo Melo sofre um atentado que o deixaria tetraplégico para o resto da vida. Acabou se tornando vítima de seu próprio talento, já que causava grande inveja por parte dos seus adversários e também por parte daqueles contra quem advogava. Não desanimava, entretanto. Tanto que até o seu último suspiro de vida terrena continuou na defesa do Direito e buscando a Justiça acima de tudo.
Por opção, não quis seguir a carreira da magistratura, pois considerava os salários baixos, mas foi amigo de juízes, promotores e desembargadores e vários outros advogados iam até ele pedir conselhos. Sua única mágoa, que talvez tenha levado para o plano espiritual foi o fato de nem a Polícia e nem a Justiça haver encontrado e punido os envolvidos pelo crime que o deixaram por vinte e cinco anos em uma cadeira de rodas.
Mas as limitações físicas em nenhum momento foram empecilho para que ele se tornasse um dos grandes operadores do Direito desta terra de Galvez, pois sempre foi muito bem sucedido na defesa de seus clientes. Por sua mente brilhante e audácia ímpar, chegou a ser indicado para compor uma lista tríplice para a cadeira de desembargador em uma vaga que era da OAB.
Um ano sem Valdo Melo e ainda há uma lacuna a ser preenchida. Mas onde ele estiver, deixou para todos nós bons exemplos e grandes lições. E que sua ausência neste plano física sirva pelo menos para que possamos refletir e ver a vida de maneira positiva, pois apesar das adversidades, ele não desistiu. Ele lutou e ele venceu. Um ano em que todos nós ainda sentimos muito a sua falta, embora sabendo que, onde estiver, está neste momento fazendo a diferença.
*Stalin Melo é professor, jornalista e sobrinho do advogado Valdo Lopes de Melo.