Estima-se que até o final do ano de 2013 cerca de 15% da floresta amazônica brasileira tinha sido desmatada. O desmatamento causa, entre outros efeitos, a redução na fertilidade do solo, erosão, alterações nos regimes hidrológicos locais e globais, e emissão de gases causadores do efeito estufa. Na Amazônia as áreas desmatadas são frequentemente utilizadas em atividades agropecuárias e quando perdem a produtividade natural geralmente são abandonadas, crescendo no local vegetação secundária conhecida popularmente no Acre como ‘capoeira’.
Da área que já foi desmatada na Amazônia se estima que aproximadamente 19% são ocupadas por vegetação secundária. Ao atingir o estádio florestal a vegetação secundária minimiza os efeitos do desmatamento, contribui para o acumulo de biomassa e ajuda na manutenção da biodiversidade. A floresta secundária também pode prover recursos à fauna silvestre e aos habitantes que vivem no seu entorno. Neste último caso um dos principais recursos oferecidos são as essências madeireiras de rápido crescimento.
Aqui no entorno de Rio Branco, por exemplo, verifica-se uma grande ocorrência da espécie arbórea Schizolobium amazonicum, conhecida popularmente pelos nativos como paricá, faveira e guapuruvu (pinho-cuiabano para os imigrantes). Esta espécie predomina em numerosos fragmentos florestais secundários da região e quem frequenta o arraial da comunidade daimista ‘Alto Santo’, no bairro Irineu Serra, pode verificar que a madeira usada na grande fogueira preparada para a festa é, em sua maioria, extraída de árvores de paricá existentes na floresta vizinha à comunidade.
Apesar do potencial de uso, o manejo de florestas secundárias na Amazônia ainda é uma forma relativamente nova de uso alternativo da terra, sendo poucos os exemplos bem sucedidos desse tipo de atividade. A carência de informações para auxiliar na identificação das potencialidades de uso de plantas em florestas secundárias limita e desestimula o manejo dessas áreas com fins econômicos. De fato, a maior parte dos esforços de pesquisa na região é direcionada para determinar o potencial de uso de florestas primárias ricas em essências madeireiras mais nobres (e de maior valor econômico) como o cedro, cerejeira, ipê, amarelão e cumaru-ferro.
Tendo em vista esta situação, uma equipe do escritório acreano do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e do Herbário do Parque Zoobotânico da UFAC resolveu avaliar o potencial de exploração do estoque de espécies madeireiras com valor comercial encontradas em alguns fragmentos florestais secundários da Área de Proteção Ambiental (APA) ‘Lago do Amapá’, localizada nas cercanias de Rio Branco. Esta APA, que tem cerca de 33% de sua cobertura vegetal composta por um mosaico de fragmentos florestais secundários,é uma unidade de conservação de uso sustentável e tem como principais objetivos a conservação da natureza e o uso direto dos recursos naturais de forma sustentável pelos seus moradores.
O estudo foi realizado em três fragmentos florestais secundários em diferentes estádios sucessionais: o Fragmento 1 tinha idade de regeneração estimada em 60 anos e área aproximada de 21 hectares, o Fragmento 2, com idade de estimada entre 35 e 40 anos, tinha uma área de aproximadamente 53 hectares, e o Fragmento 3, com idade de regeneração estimada entre 25 e 30 anos, tinha cerca de 31 hectares de área. Em cada fragmento foi feito um inventário de um hectare de floresta no qual todos os indivíduos arbóreos com diâ-metro a altura do peito (DAP) igual ou maior que 10 cm foram identificados botanicamente e mensurados (DAP e altura comercial).
Para determinar o potencial madeireiro dos fragmentos calculou-se o volume dos indivíduos amostrados utilizando-se uma fórmula que considerou o DAP, a altura comercial e um fator de correção de forma. Para determinar quais espécies encontradas no inventário eram comercializadas em Rio Branco foi feito um estudo no mercado local que consistiu em visitas in loco a estabelecimentos comercializadores de madeira e produtos derivados.
O estudo de mercado realizado em Rio Branco resultou em uma lista com 75 espécies madeireiras sendo comercializadas na cidade. Destas, 39 ocorriam nos fragmentos florestais inventariados na APA Lago do Amapá, assim distribuídas: 31 espécies e 142 indivíduos no Fragmento 1 (+60 anos em regeneração), 20 espécies e 103 indivíduos no Fragmento 2 (35 a 40 anos) e 12 espécies e 52 indivíduos no Fragmento 3 (25 a 30 anos). No Fragmento 1 as espécies com maior número de representantes foram limãozinho (Zanthoxylum rhoifolium), breu-miúdo (Protium spp.) e ucuuba (Virola elongata), com 21, 18 e 13 indivíduos, respectivamente. No Fragmento 2 as espécies mais abundantes foram o cumaru-cetim (Apuleia leiocarpa) e o limãozinho, com 36 e 10 indivíduos, respectivamente. No Fragmento 3 a espécie mais abundante foi o mulateiro (Calycophyllum spru-ceanum), com 23 indivíduos.
O estoque volumétrico de madeira no Fragmento 1 foi de 58,7 m³/hectare, com a marupá (Jacaranda copaia) com o maior volume (10,4 m³). No Fragmento 2 o volume foi de 27,2 m³/hectare, sendo o marupá a espécie com maior volume. No Fragmento 3 o volume foi de 21,2 m³/hectare, sendo o mulungu a de maior volume. As árvores que apresentaram diâ-metro mínimo de corte (DMC), ou seja, o diâmetro mínimo que uma árvore deve ter para que seja permitido o seu corte em projeto de manejo florestal sustentável, representaram um volume de 21 m³ no Fragmento 1 e 2,1 m³ no Fragmento 3. No Fragmento 2 não foi encontrado nenhum indivíduo com DMC.
O volume das árvores pré-comerciais, ou seja, com DAP entre 30 e 50 cm foi de 19,2 m³ no Fragmento 1, 10 m³ no Fragmento 2, e 10,6 m³ no Fragmento 3. Considerando um incremento médio anual de 0,86 m³ (estimativa prevista Resolução 406/2009 do Conselho Nacional do Meio Ambiente-Conama),o tempo de espera para que essas árvores pré-comerciais atinjam o volume de 30 m³/hectare (volume máximo a ser explorado em ciclo de corte de 35 anos) nos Fragmentos 1, 2 e 3 será de, respectivamente, de 12 ½ anos, 23 anos e 2 meses, e 22 anos e 5 meses.
A conclusão do estudo foi que na atualidade a exploração madeireira nos fragmentos florestais avaliados na APA Lago do Amapá não é viável porque são poucas as árvores que apresentam diâmetro mínimo de corte de 50 cm. Embora o tempo de espera para que o volume de madeira/hectare atinja 30 m³ seja de pouco mais de 12 anos, sob o ponto de vista legal a exploração só poderá ser autorizada quando as árvores atingirem o DMC. E as estimativas que foram feitas indicam que isso demandará um tempo que varia entre 50 e 200 anos.
* Engenheiro Agrônomo e pesquisador do INPA e do Parque Zoobotânico da UFAC
** Engenheira Florestal, Pós-Graduanda em Licenciamento e Estudos Ambientais na Universidade Santa Cecília, São Paulo.