X

E quando o crime é a única alternativa?

Sociólogo explica motivos para aumento da violência na sociedade acreana

Faz tempo que Rio Branco deixou de ser pequena em territorialidade para ser grande nos números e no grau de violência registrada todos os dias nas páginas e programas policiais na televisão. A população, desde a mais carente até os comerciantes, tem sentido na pele o clima de insegurança que tem assolado a Capital.

Não vamos falar de números ou operações policiais. É preciso entender que o atual sistema prisional e de segurança é um modelo falido. É o que acredita o cientista social, Nilson Euclides da Silva.
O professor ressalta como perigosa a combinação de uma polícia mal preparada, mal remunerada em uma realidade de uma sociedade desigual. “São combinações perigosas, porque levam à corrupção policial. No caso da Polícia Militar, carrega aquele ranço da truculência característico da época da ditadura. Tudo isso em uma sociedade que ocupa espaços urbanizados de forma equivocada. A pobreza é apenas um dos fatores da violência”, detalha o cientista social.

A grande maioria dos criminosos que atua hoje é de jovens, a partir dos 18 anos ou até menos, que bateram de frente com uma sociedade desigual.
“Nesse caso, estamos falando de um jovem que está numa família desmantelada. Esse jovem se sente excluído do seu próprio meio social. Vivem em locais periféricos. Já sofreram ou sabem de alguém próximo que sofreu com a truculência da polícia nesses locais”, exemplifica Nilson.

É nesse momento que o mundo do crime entra em cena, disposto a proteger e oferecer uma expectativa a esse jovem. “Essas pessoas se acham vítimas e se organizam fazendo o jovem sentir que é parte de algo. Essa necessidade de inclusão é do ser humano. Imagina para um adolescente que ainda está em fase de formação e afirmação?”, detalha Nilson.
Nessas situações, o crime tem sempre a porta aberta. Tudo é sempre mais fácil, aponta o sociólogo. “Esse empoderamento que o crime dá é muito perigoso”.

Diante das situações apresentadas, o cientista social é enfático ao dizer que o problema não é fácil de resolver, mas, que existem alternativas para que mudanças ocorram A médio e longo prazo.
Como, por exemplo, o avanço e efetividade da integração do trabalho das polícias, investimento em tecnologia de informação e gestão, além de um quadro qualificado de profissionais nesses setores.
Outra medida seria a efetivação da escola em tempo integral, pelo menos no primeiro ciclo, sugere Nilson. Teria que se pensar numa verdadeira revolução na Educação.
“Isso já impactaria drasticamente na redução dos índices de violência. Escolas com estrutura física, espaço para lazer. Trabalhando disciplinas integradas, tratando de assuntos como o preconceito, racismo, pluraridade. Se esse jovem for tratado dessa forma, ao chegar aos 11 anos, ele vê o mundo com outro olho”, destaca.

Esse outro empoderamento, associado a lazer, cultura, atividade profissional e perspectiva de vida, livra os jovens do mundo do crime, ressalta Nílson.
“O jovem tem que se sentir protagonista da própria vida, porque no crime ele se sente assim. Ele pega uma arma e se sente dono da lei. ‘Eu tenho poder’. Quando se perde valores humanos, não tem como recuperar. Certamente, esse jovem se torna um adulto violento e que, ao entrar para uma unidade prisional, tem que cumprir regras, impostas pelos próprios criminosos”.

E, para o mundo do crime, tudo é possível. “Após a entrada nesse sistema, o jovem se reafirma aumentando o grau de violência de seus atos. Contando sempre com a impunidade e a lentidão do sistema judiciário. Isso cria a expectativa de que o crime compensa. Claro que quando ele chegar ao sistema prisional, ele vai perceber que não é como ele pensava aqui fora. Mas o crime já foi cometido”, acrescenta Nilson.

Atualmente, o país não oferece uma política efi-ciente de reinserção, lamenta o cientista social. “Uma vez dentro, dificilmente ele será recuperado”.


A falta de políticas sociais colaboram para que os jovens encontrem no mundo do crime uma perspectiva de vida

Alternativas que causam impacto na redução da violência


Empoderamento oferecido pelo crime é perigoso, diz Nilson

O cientista social Nilson Euclides da Silva explica que não existe uma solução acabada para resolver a questão da violência em Rio Branco, ou em qualquer outra cidade brasileira. O que existem são algumas alternativas que, ao serem efetivadas, não levariam muito tempo para dar retorno. Com isso, o número dos casos de violência sofreria uma redução.
Uma delas é o  investimento em uma polícia inteligente, com uma base de dados integrada. Atualmente, Nilson acredita que há ações integradas esporádicas. Isso deveria ser rotina.
“Adotar um discurso técnico é fundamental para o sucesso desse processo. A implantação de uma base de dados integrada é o mínimo que uma polícia poderia ter numa cidade como Rio Branco. É necessário qualificar esse policial para que ele pense em segurança de forma estruturada e global. Com tecnologia de ponta, fazendo mapeamento e georreferenciamento do território. Aproveitar que a cidade ainda é pequena, e é possível fazer”, detalhou Nilson.

O cientista social comenta que em plena era digital e suas infinitas possibilidades, o policiamento é feito como antigamente. “Os investimentos são feitos em viaturas, revólver e colete. Os romanos também faziam isso, só que na época era no escudo, na biga e na espada”, relacionou.

Apesar das duras críticas ao sistema, Nilson defende o policial. “Não questiono o investimento na melhoria salarial, por exemplo. Porque eles têm que ganhar muito bem sim. Mas, infelizmente, os policiais são o ponto fraco desse sistema”, afirmou.

Quando o criminoso já atingiu um alto grau de violência só a repressão mesmo. “Por isso, também defendo a existência de grupos como o Bope”, exemplificou.
Sobre gestão integrada, o cientista explica que ela deve ocorrer de forma full time, com livre trânsito de informação entre as polícias. “Quanto desperdício de combustível numa ronda a noite em Rio Branco. É necessário redistribuir a força policial, sistemática, geoprocessada e, principalmente, com relação direta com a comunidade”.

Criar uma relação entre gestores da Segurança Pública e sociedade nesse processo é fundamental, ressalta o professor. Tratar a comunidade e construir uma sociedade que seja capaz de integrar esse trabalho.

“A população deve pensar no policial como alguém que tenho prazer em receber na casa. Mas esse processo é mais demorado. Enquanto isso não ocorre, é necessário pensar na instituição de uma guarda civil metropolitana. Para preservar o patrimônio público e também fazer a aproximação com escolas e instituições. Seria o link entre a comunidade e a segurança pública”, detalhou Nilson.
Apesar das críticas ao sistema em vigor, Nilson se coloca à disposição para que junto com outros setores da sociedade possam avançar na efetivação dessas políticas para melhorar o sistema. “Não dá para pensar segurança pública desarticulada de outros setores. As ações têm que ser integradas. Os países que conseguiram implantar um novo sistema de segurança pública investem pesado até hoje em políticas sociais, saúde e emprego. A sociedade precisar estar disposta a pagar esse preço para futuras gerações”, concluiu.

Como uma tragédia transformou a vida de um adolescente em conflito com a lei

Ainda criança, João Lucas (nome fictício), veio de Tarauacá para Rio Branco com os pais e seis irmãos em busca de melhores condições de vida. Ele, assim como a maioria dos meninos da sua idade, gostava de brincar de peteca e bola quando chegava da escola. A rotina da família era a mais normal possível, até que um episódio marcou a história de todos eles para sempre.
Aos 12 anos, João Lucas viu o pai ser assassinado diante de seus olhos. O fato gerou uma revolta que culminou em uma adolescência marcada pelo crime.
Atualmente, aos 18 anos, ele recorda com tristeza o momento em que a vida do pai dele foi arrancada brutalmente.

A morte do pai

Era um dia comum da semana. “Tudo começou com uma brincadeira de taking ball. Minha irmã pequena e a irmã desse cara, que era nosso vizinho, começaram a brigar na rua. No meio da desavença, o irmão do vizinho deu uma ripada na cabeça do meu irmão, que ficou tonto e não reagiu”, descreve João Lucas.

Quando o pai do menino chegou do trabalho no início da noite e soube do ocorrido, foi até o irmão pedir ajuda para tirar satisfação com o agressor do filho dele. Esse irmão, tio do João Lucas, pegou uma faca e colocou na cintura.

Os dois chegaram até uma quadra de areia em busca do agressor, mas acabaram encontrando o irmão dele, vizinho da família. Ele estava usando drogas. “Quando o meu tio perguntou pelo irmão dele, que havia batido na cabeça do meu irmão, o vizinho se alterou e começou a ameaçar os dois. Então, meu tio desferiu alguns golpes de faca nele. Meu pai foi quem não deixou ele matá-lo”.
Após o episódio, a família saiu do bairro e passou algumas semanas distantes. Voltaram um tempo depois, com o pensamento de que tudo estava amenizado. As crianças retornaram para a escola e os pais voltaram a trabalhar.

João Lucas lembra que o pai havia sofrido um acidente no trabalho e, por isso, estava se recuperando em casa, cheio de curativos. Mal conseguia andar, com uma das pernas fraturada.
Foi quando o vizinho deles, o mesmo que havia sido esfaqueado pelo tio de João, entrou armado no quintal da família. O menino de 12 anos estava brincando na rua de casa com os irmãos, quando viu o pai ser assassinado na varanda de casa com vários tiros.

“Desde que isso aconteceu, eu fiquei com uma revolta dentro de mim. Agora eu tô aí. Pretendo sair dessa vida um dia”.
Por muito tempo, João procurou vingança. Ele adotou como um objetivo de vida matar o assassino do seu pai. Nunca conseguiu. No lugar, cresceu uma revolta, que ele descontou no resto do mundo. Dali em diante, João Lucas já não era mais um garoto comum. Ele adotou uma frieza na alma e entrou para o mundo do crime.

Crime organizado

Após a tragédia, aliciado por outras pessoas, ele começou a usar drogas. Logo deixou os estudos. Não gostava das aulas. Sempre que podia, fugia da escola para ir se drogar, ou, como ele diz, tomar o que era dos outros.

Saiu de casa cedo. Conseguiu uma vaga no crime organizado. Trabalhava vendendo drogas e ganhava dinheiro com isso. Recebia ordens de dentro do presídio a respeito dos assaltos que deveria fazer. Segundo o rapaz, o preso, líder do bando, ligava para ele e indicava quem ele deveria roubar.

“Lá de dentro (do presídio), a gente tinha informação privilegiada. Eram muitas pessoas que participavam do grupo. Quando pintava um corre (um possível roubo), a gente se reunia, pegava as armas, dividia as tarefas e ia. Nisso, já tinha outro grupo para ir no outro corre também. Tudo na mesma noite”, relata.
João nem lembra mais quantas pessoas ele já roubou. Perdeu as contas. “Tem cara que é muito nervoso, já chega espancando. Eu não. Pergunto pelos objetos com tranquilidade. Só quando não tinha outro jeito, eu partia para a agressão”.

O jovem revela que sentiu muito medo de morrer uma vez, ao roubar um policial. “Ele ainda tentou reagir. Eu ia dar um tiro no meio da cara dele, só que o meu parceiro que estava comigo deu um golpe e ele se rendeu, senão tinha morrido, ou eu. Porque quando a gente tá nisso, a gente sabe. A gente vai já no pensamento: eu vou pra matar ou eu vou pra morrer. A gente sabe que qualquer vacilo, distração, é fatal, tanto pra nós, quanto pra eles”.

O socioeducando revela que já chegou a ter R$ 20 mil só para ele, fruto de um único serviço. Com o dinheiro, ele comprava mais drogas para comercializar, armas, roupas e até moto. Ele e o grupo tinham uma casa própria para a venda de entorpecentes, mas não dormiam no mesmo local.  “Hoje em dia eu não tenho mais nada. Só a minha vida, porque Deus é bom”.

A apreensão

Ambicioso, aos 16 anos, João Lucas foi convidado por outro comparsa a participar de um roubo grande. A proposta era pegar o cofre de uma residência e ficar com 150 mil reais, que, supostamente, estariam guardados ali. A quantia seria dividida apenas para três pessoas, incluindo ele. A casa ficava em Xapuri.
“Eu pensei no tanto de dinheiro que era aquilo. Nosso plano era pegar o dinheiro, descer para a Bolívia, comprar umas armas e passar uma semana lá. Só então a gente voltava para Rio Branco. Mas, infelizmente, deu tudo errado”, afirma.

O filho do proprietário da casa entrou no momento em que o grupo efetuava o roubo. “Acho que ele tinha uns doze anos. Tivemos que levar ele junto até certo ponto. Deixamos o menino no caminho, preso em uma árvore. Fomos presos só no outro dia de manhã”, relata.

Indagado sobre o sentimento em relação a sequestrar um garoto de 12 anos, João Lucas declara que na época não pensava nele. O que realmente almejava era fugir com o dinheiro. Hoje, ele faz reflexões diferentes.

“E se fizessem com a minha família? Eu ia querer descobrir quem foi e então eu iria matar”, analisa.
Ao ser apreendido pela polícia, João foi encaminhado a um dos centros socioeducativos de Rio Branco, onde cumpre medida até hoje. E não sabe quando vai sair.

Daqui pra frente

O jovem afirma querer mudar de vida para não ver mais a família sofrer. Ele sabe que a mãe ficaria arrasada se ele morresse. “Antes, quando me falavam assim: vamos ali matar um moleque. Eu nem perguntava o motivo. Dizia apenas: ‘peraí que eu vou ali em casa pegar a minha arma’. Hoje tenho um novo pensamento, porque quando a pessoa entra no sistema, ela tem duas opções: cemitério ou cadeia”.

O ciclo de amizade que João tinha antes de ser apreendido está cada vez menor. Ele explica o motivo. “Depois que eu vim preso, já vi um monte de caras que eu conhecia sendo baleados lá fora, sendo mortos. Um menino que puxou aqui comigo, que eu conhecia lá de fora, morreu em um assalto. O que morreu no Bairro da Paz era meu camarada. Não chegou nem aos 18 anos. Isso me faz pensar”.

Apesar de hoje já não ter mais pesadelos com a morte do pai, João Lucas admite ainda não ter se livrado de alguns sentimentos fortes. “Se eu disser que não sinto mais revolta, vou estar mentindo, porque é algo que não tem como esquecer. Às vezes, eu estou deitado e me vem as lembranças. Então, eu tento logo me distrair. O que aconteceu comigo eu não desejo nem para o meu pior inimigo”.

O objetivo atual do rapaz é terminar os estudos, que ele já retomou dentro da unidade socioeducativa, e, ao ficar em liberdade, conseguir um emprego. “Meu sonho agora é me formar em Direito, dar ao menos um orgulho para a minha mãe”.


João Lucas (nome fictício) nem lembra mais quantas pessoas ele já roubou, hoje no sistema socioeducativo ele pensa em mudar de vida

“Eu queria a sensação de poder”

“A sociedade chama a gente de bandido, diz que é para a gente estar morto”.

Aos 18 anos,  Marco Afonso  (nome fictício) já viveu coisas que muitos nem sonhariam. Teve uma infância encurtada pela entrada no mundo das drogas e toda a adolescência foi marcada por atos infracionais, além de algo obscuro que mudou completamente a vida dele: um homicídio.

 Atualmente, ele cumpre medidas socioeducativas no Centro Socioeducativo Acre, em Rio Branco. Marco ainda está privado de liberdade em um local próprio para adolescentes, porque cometeu o homicídio quando tinha 16 anos. Ele terá de concluir a medida na unidade, mesmo já tendo alcançado a maioridade, conforme a lei.
Muitos olham para Marco Afonso a partir do ato infracional que ele cometeu na adolescência e ignoram o antes. Para entender o que tirou do jovem, aparentemente calmo e educado, a essência da vida e o brilho da infância e da adolescência é preciso mergulhar no seu passado.

A busca pelo poder

Marco Afonso tinha 10 anos quando usou droga pela primeira vez. Ele começou pela maconha, mas logo estendeu o vício à cocaína e ao álcool. “Eu sabia que não era uma criança como as outras, que a inocência já havia se perdido. Comecei a andar com pessoas diferentes e a vender droga muito cedo também”, relata o rapaz.
Com 12 anos, no início da adolescência, Marco já andava pelas ruas da periferia e quadras para comercializar a droga. “Eu já não era a mesma pessoa. Tinha outro pensamento, outras atitudes. Eu queria a sensação de poder”.

Com o tempo, a mãe de Marco foi percebendo que algo estava errado, devido à mudança tão radical no comportamento do filho. Com tristeza, descobriu o vício do menino e pediu que ele parasse. “Prometi que ia deixar. Ela acreditou, mas eu nunca parei”.

Ainda aos 12 anos, Marco já dava festas com o dinheiro que ganhava no mundo do crime. Eram reuniões de ostentação regradas a muito álcool e droga. Em um desses dias, ele chegou a passar mal após cheirar muita cocaína. Foi quando a mãe descobriu que o menino continuava perdido.
O uso abusivo de drogas causou a queda no desempenho escolar. Ele já não conseguia se concentrar nas aulas e tirar boas notas. Olhando a sua volta, via rostos de jovens com expectativas tão simples como namorar, brincar e fazer amigos. Marco se sentia um peixe fora do aquário, debatendo-se para respirar. Era como se já não pertencesse àquele mundo. Então, resolveu desistir dos estudos.

O rapaz seguiu comercializando drogas em Rio Branco. O dinheiro que ganhava ia da mesma forma que chegava: fácil. “Eu não tinha cabeça para guardar dinheiro e gastava bem rapidinho. Fazia festas e pagava bebida para todos”.

Aos 15 anos foi para o sistema socioeducativo pela primeira vez por tráfico de drogas. Após dois meses, conseguiu progredir para a semiliberdade, mas acabou descumprindo a medida. “Não lembro exatamente por que eu descumpri. Acho que era porque eu não quis fazer diferente. Não vou mentir. Na minha primeira internação, não mudou nada na minha cabeça”.


Usuário de álcool e de outras drogas desde os 10 anos, Marcos Afonso (nome fictício) matou uma pessoa

O homicídio

“Eu tinha cheirado cocaína e passado a noite inteira acordado. O cara chegou para comprar droga e começou a embaçar comigo. Nos desentendemos e brigamos. Foi quando eu o acertei com uma perna-manca (pedaço de madeira)”, lembra Marco.

Quando Marco percebeu que tinha acabado de matar uma pessoa, fugiu e se escondeu em uma chácara. Voltou dois meses depois, ciente que seria preso a qualquer momento, devido ao empenho da polícia em prender o autor do homicídio.

“Eu estava em casa e percebi que havia passado na rua um carro da polícia disfarçado. Ele passou novamente. Então escutei o ferrolho do portão abrindo. Na hora em que eles estavam arrodeando o quintal, fui abrir a porta, pois sabia que seria preso. Foi quando eles me lançaram na parede e colocaram uma arma na minha cara. Eu não quis reagir”.

Internação

Marco Afonso cometeu o homicídio quando ainda era adolescente, por isso, segundo as leis brasileiras, não pode ser preso em uma penitenciária com adultos. Ele foi encaminhado a uma das unidades socioeducativas de Rio Branco, onde centenas de jovens cumprem medida de internação, que é quando se é privado de liberdade. No entanto, todos os outros direitos devem ser preservados.

Lá, os horários são bem rígidos e a rotina é bem diferente do conforto de um lar. Além de conviver com muitas outras pessoas que já cometeram algum ato infracional, algumas não tão amigáveis, ele é tirado totalmente do convívio em sociedade.

“A sociedade chama a gente de bandido, diz que é para a gente estar morto. Mas eu tenho para mim que todo mundo erra, que ninguém é perfeito. Tem pessoa que se acha no direito de julgar o erro da outra, sendo que às vezes ela é pior. Tem gente que fala que bandido tem que tá morto, mas nem conhece a pessoa, não sabe qual a história dela, não sabe o que passou”, se defende.
Apesar de o lugar assustar muitos dos socioeducandos, para Marco, o que ele menos gosta no fato de estar internado é receber a visita da família ali dentro. “Para mim, isso é o mais constrangedor. Eu sei que estou pagando pelo o que fiz, mas a minha família está pagando junto comigo, sendo que não fez nada. O culpado sou eu”.

Projetos

Na unidade socioeducativa, Marco Afonso voltou a estudar. Hoje ele faz a Educação para Jovens e Adultos (EJA). Conta que é aluno nota dez e que gosta da escola.
Agora, ele nutre um sonho difícil de ser alcançado, mas não impossível. Marco quer se formar em Medicina. “Quero ser clínico geral. Quero ajudar as pessoas e compensar um pouco o mal que eu fiz”.

O rapaz admite que ainda não se perdoou. Por isso, pensa tanto em se redimir de alguma forma. “O que eu fiz não volta. O que posso fazer é só tentar recompensar”.

Apesar de saber das dificuldades que vai encontrar ao sair da unidade, Marco se mostra otimista com a nova fase da vida. “Meu pensamento deu uma reviravolta. Eu parei de usar droga e sei que quando eu sair daqui vai ser diferente. Da primeira vez que fui internado eu não havia mudado em nada. Hoje, eu me sinto mudado desde que meu irmão foi preso. Com o sofrimento da minha mãe percebi que não queria aquilo para a minha vida. Eu sei que vai ser diferente, porque sou novo, tenho chance de fazer faculdade, conseguir um emprego bom, ajudar a minha família”, afirma.

A Gazeta do Acre: